Há cerca de três anos, Mo Ibrahin, um multimilionário Sudanês, Fundador da empresa de telecomunicações Africana Celtel International, decidiu “inventar” um prémio para estimular a boa governação em África. Esse “generoso” senhor teve a simpatia de aplicar uma pequena parte da sua fortuna pessoal (cerca de 3.5 mil milhões de euros que ganhou com a venda da sua empresa em 2005 a um operador do Koweit) num prémio inédito que distingue anualmente antigos chefes de Estado ou de Governo Africanos por práticas reconhecidas de boa governação e cujo objectivo é "melhorar as perspectivas sociais e económicas do povo Africano", nas palavras do seu criador, e incentivar a diminuição/irradiação de um dos maiores cancros do nosso continente, digo eu!
Nas duas primeiras edições, em 2007 e 2008, foram agraciados com esta honrosa distinção (honrosa e choruda distinção, melhor dizendo) o ex-presidente de Moçambique, Joaquim Chissano e o ex-líder do Botswana, Festus Gontebanye Mogae que vão ter as respectivas contas bancárias engordadas em cinco milhões de dólares norte-americanos, que serão distribuídos durante dez anos em tranches anuais de 500 mil dólares. Nada mau, nada mau mesmo, se levarmos em consideração que esses senhores foram merecedores desse prémio, segundo o júri da Fundação “ Mo Ibrahim”, “apenas” por terem cumprido com seriedade e transparência os cargos para o qual foram eleitos, ou seja, fizeram o que se espera de qualquer político eleito para os mais altos órgãos de soberania de uma nação: Cumprir os mandatos respeitando os preceitos da boa governação. Eu também não me importaria nada se alguém inventasse um prémio de “boa governação do lar” e me premiasse por pagar a renda da casa onde vivo dentro do prazo ou as contas da agua e da luz (a comparação pode ser um pouco redutora, mas creio que faz sentido), mas infelizmente ninguém é maluco o suficiente para dar prémios aos outros por coisas consideradas “normais”. Costuma-se premiar o “extraordinário”, o “diferente”, o “original” e para mal dos nossos pecados, ainda não é “normal” na nossa África, aparecerem dirigentes políticos que promovam as práticas da boa governação, daí o premio para aqueles que marcam a diferença, os “anormais”, nesse caso.
Estranhamente (ou não), esse ano, o juri presidido pelo ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan e que tem entre os seus membros Graça Machel, presidente da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC) e a ex-presidente da República da Irlanda Mary Robinson, decidiu não atribuir o prémio a ninguém e a pergunta que se impõe é aquela que vinha estampada na camisola do “super” Mário Jardel na época em que jogava no melhor clube de Portugal: "Porque será?" Não, não é do guaraná e como os membros do júri reservaram-se no direito de não dar explicações para não ferir susceptibilidades, começam a circular à “boca pequena” boatos de que o coitado do Mo Ibrahim está um bocado “desferrado”, por isso decidiu não dar os 5 milhões de dólares a ninguém, ele que há quatro anos era detentor de uma fortuna de 3.5 mil milhões de euros (creio que mesmo com a crise e supondo que o homem também tivesse entrado no esquema do Madoff, um gestor cauteloso e empreendedor como ele, não iria por todos os ovos no mesmo cesto de forma a “queimar” tanto dinheiro, mas nunca se sabe). E se eu vos disser que entre os líderes Africanos que deixaram funções recentemente estão os antigos Presidentes da África do Sul, Thabo Mbeki, do Ghana, John Kufuor e da Nigéria, Olusegun Obasanjo? Entendem agora porque que o prémio desse ano não foi atribuído?!
Quer queiramos, quer não, a verdade é que muitos dos graves problemas que ainda hoje assolam o nosso continente se devem exclusivamente a falhas graves na governação por parte daqueles que têm conduzido o destino dos nossos Países desde que se tornaram independentes (salvo as raríssimas excepções). Se no princípio podiam desculpar-se com a inexperiência e a falta de qualificação dos quadros, resultante das políticas discriminatórias que restringiam o acesso à educação por parte dos nativos no tempo colonial, hoje em dia tal premissa já não é valida, dado que a esmagadora maioria dos nossos políticos são pessoas formadas, informadas e viajadas, logo, conhecedores de diferentes realidades, o que por si só, devia lhes conceder pelo menos a capacidade de importar o que de bom se faz noutras latitudes, já que se têm mostrado incapazes (na maior parte das vezes) de criar qualquer coisa de jeito. Se no princípio o desnorte deveu-se à incompetência, à burrice e à negligência, hoje juntamos (ainda) a incompetência, à má fé, à preguiça e à ganância.
Mo Ibrahin, um visionário nos nossos tempos, quis marcar a diferença e disponibilizou-se a recompensar com o seu dinheiro todos aqueles que queiram mudar o rumo dos acontecimentos numa África que é de todos os Africanos. Pode-se não concordar com a estratégia utilizada, mas temos que homenageá-lo pela iniciativa. Mas, serão os 5 milhões de dólares suficientes para fomentar uma mudança de mentalidade dos nossos governantes? Aqueles que governam Países pobres de parcos recursos se calhar até acharam gira a ideia, mas os outros “tubarões” que facilmente conseguem ter nas suas contas secretas o dobro ou triplo desse valor por vias travessas não devem “ estar nem ai” para o prémio.
Tudo isso faz-nos questionar se a não atribuição do prémio esse ano foi a excepção que confirma a regra ou se a excepção foi a descoberta de dois espécimes raros nos anos anteriores. Quem viver, verá!
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