segunda-feira, 26 de outubro de 2009

CONVERSAS SOLTAS XXIII - Sobre a polemica na Procuradoria geral da Republica.

* Dois compatriotas armados em intelectuais, trocavam umas ideias sobre a façanha do Procurador-geral da república:

Compatriota I - Definitivamente o nosso sistema de justiça encontra-se mergulhado numa crise sem precedentes.

Compatriota II - Olha, isso para mim é novidade. Não sabia que existia um sistema de justiça em São Tomé e Príncipe.

I - Não sejas tão sarcástico. As coisas podem não funcionar como deviam, mas daí dizeres que não temos um sistema de justiça, é um bocado exagerado.

II - Achas exagerado?! Um sistema, seja lá do que for, pressupõe a existência de uma organização minimamente estruturada, submetida á preceitos funcionais e a uma cadeia hierárquica bem identificada que a faça cumprir de forma efectiva os objectivos que nortearam a sua criação. No que a justiça diz respeito, vês alguma coisa parecida com isso em São Tomé?

I - Epá, temos Tribunais, temos um Ministério da Justiça, uma Procuradoria, Juízes, advogados, prisões, Policias e.t.c. Creio que a soma dessas partes é que forma o sistema de justiça de um País.

II - Estás enganado, meu caro! O que temos são alguns bons advogados, 3 ou 4 Juízes razoáveis, um Ministro da Justiça preguiçoso e acomodado, um Procurador-geral da Republica pouco imparcial e ávido de protagonismo, um conjunto de leis do tempo da outra senhora que poucos estão interessados em actualizar, uma polícia criminal que investiga à base do cassetete, funcionários judiciais mal formados, alguns até sem formação nenhuma, sem esquecer a desavergonhada influência que o poder político exerce em grande parte das deliberações judiciais, o que viola o princípio sagrado da separação de poderes. Achas que nessas condições se pode dizer que temos um sistema de justiça em STP? Daqui a bocado vais dizer-me que também temos um sistema de saúde ou um sistema de educação, não é?

I - Está bem, não vou tentar contrariar-te! Reformulo o que disse: O nosso pseudo sistema de justiça está mergulhado numa crise sem precedentes. Está melhor assim?

II - A parte do pseudo sistema soa melhor. Quanto a isso de crise sem precedentes, creio que não é bem assim. Alguma vez sentiste que não estávamos em crise nessa área? Alias, se o próprio País vive numa crise geral há mais de 34 anos, porque que carga de água é que no sector da justiça as coisas teriam que ser diferentes? Assim a vista desarmada dá para identificar apenas 3 ou 4 sectores económico-sociais que nunca entraram em verdadeira crise no nosso País: O da construção de moradias, o da comercialização de viaturas 4 x 4, o das bebidas alcoólicas e o das catorzinhas. Todo o resto acompanha a degradação que se vive na área da justiça.

I – Podes até ter razão, meu caro, mas embora se possa dizer que há uma crise permanente na nossa justiça, creio que, com essa história do Procurador-geral da Republica ter arrombado ou mandado arrombar o gabinete do procurador adjunto para lhe roubar o processo STP - Trading, batemos no fundo. È totalmente surreal, essa atitude do Procurador-geral.

II – Mas isso já foi confirmado? A Procuradoria não emitiu um comunicado a desmentir essa história e a dizer que os autores da denúncia estavam a ser tendenciosos?

I – Emitir, emitiu. Mas agora foi o próprio procurador adjunto quem escreveu uma carta ao Presidente da Assembleia a corroborar a versão apresentada pela ordem dos advogados e a fazer outras acusações ao Procurador-geral. Acho até que já apresentou uma queixa na PIC por invasão do gabinete e desvio do processo.

II – Épa, não tinha conhecimento dessa carta. Isso é gravíssimo! E o Procurador-geral já reagiu à essa carta?

I – Que eu saiba não. Mas como os fins-de-semana na nossa terra são dedicados exclusivamente aos forrobodós e aos comes e bebes e não há nada que faça quebrar essa rotina, talvez só na segunda-feira teremos uma reacção. É como eu te disse, desta vez, batemos no fundo.

II – Como diriam os Brasileiros: bota fundo nisso! Era só o que nos faltava, depois de termos advogados que roubam processos no tribunal, juízes que comem água semanalmente com advogados e arguidos, advogados que protagonizam fugas espectaculares do tribunal e juízes que decretam prisões preventivas por truta e meia nuns casos e noutros pedem escusa por medo, agora temos um Procurador-geral da Republica armado em arrombador de portas.

I – Tudo isso porque estava a expirar o prazo para a dedução da acusação ao Armando Correia e ao Osvaldo Santana no âmbito do processo STP-trading. E o mais grave é que o Procurador adjunto diz que não encontrou matéria suficiente para levar o processo adiante e recusou-se a cumprir uma ordem do procurador-geral nesse sentido. Pelos vistos já estava decidido que o processo tinha que avançar a qualquer custo.

II – É mais um caso jurídico com contornos políticos. Sempre achei que nessa história da STP-trading a montanha iria voltar a parir um rato, como tem sido apanágio nos casos em que estão envolvidos peixes graúdos em STP.

I – Pode ser que com esse desvario do Procurador-geral, a coisa possa ter contornos diferentes.

II – A tua ingenuidade as vezes espanta-me. Acreditas mesmo que isso vai dar em alguma coisa? Vais ver que ainda vão inventar uma história descabida para justificar esse imbróglio todo, isso se não for o próprio Procurador adjunto, depois de devidamente pressionado, a vir desmentir tudo e dizer que não foi ele que assinou a tal carta, para salvaguardar o seu futuro profissional. Sempre foi assim, os gordos arranjam sempre forma de fazer vingar com todo rigor a velha máxima que diz que as leis são como as teias de aranha, apenas os pequenos insectos ficam presos nelas, os grandes atravessam-na.

E com essa pérola da sabedoria popular, deram por encerrada a conversa.

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