quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

HÁ QUEM LHE CHAME "MUDANÇA" - Parte II

Como ficou resumido no texto anterior, o governo do ADI tinha quase tudo ao seu favor para trilhar com sucesso o caminho espinhoso da verdadeira “mudança”, a tal que andaram apregoar na altura da campanha eleitoral e de que São Tomé e Príncipe tanto necessita para “dar certo”, como costumam dizer os brasileiros. Para isso, nem precisavam de resolver de uma assentada todos os problemas que nos afligem, até porque os nossos problemas estruturais não desaparecerão de um dia para outro, por passe de magia, mas era imperioso transmitirem sinais claros de que estão ao menos, empenhados em resolve-los e isso, para mal dos nossos pecados, não tem acontecido, muito pelo contrário.

Assim à vista desarmada e para começo de “conversa”, ocorre-me mencionar três medidas populistas assumidas por esse governo que, se fossem realmente aplicadas, garantiriam por si só, o corte radical com o passado recente e a consequente admiração e o respeito de grande parte dos São-tomenses que não votaram no ADI:

O senhor Primeiro-ministro aceitou o desafio de fazer a declaração pública dos seus bens e, em nome do combate à corrupção, disse que iria criar as condições para fazer disso, pratica corrente para os altos funcionários do estado. Disse também que, na era da “mudança”, os directores das empresas, institutos e organismos do estado seriam avaliados apenas pela sua competência técnica e produtividade, nunca pelas suas preferências partidárias e, num claro acto revolucionário, garantiu também, que, com raras excepções, as viaturas do estado deixariam de andar na “vadiagem” aos fins-de-semana e em horários nocturnos. Era a “mudança” a manifestar-se em todo o seu esplendor. E o que aconteceu na prática?!

Na questão da declaração pública dos bens do senhor Primeiro-ministro, passados 4 meses, continuamos a espera que se faça luz sobre esse assunto, não sabemos se por puro esquecimento, por excesso de viagens, perdão, de trabalho, por falta de tempo para fazer o inventário, ou por puro desinteresse mesmo. A verdade é que o homem fez-nos acreditar que iria marcar a diferença também nesse ponto e até agora nada! Isso é mudança?!

Na questão dos “directores” do aparelho do estado, obviamente que estávamos a espera que alguns fossem substituídos, por ocuparem cargos de confiança política, mas depois das afirmações do senhor Primeiro-ministro, fazendo apologia da competência e da produtividade, ninguém esperava a autêntica razia que houve nesse sector e a consequente promoção de militantes e amigos/familiares de militantes do ADI. Se por um lado podemos até aceitar que os que saíram eram todos incompetentes, dorminhocos e preguiçosos, por outro lado, é muita coincidência que apenas tenham entrado pessoas que se identificam com as cores amarela e azul, ou seja, voltamos aos maus hábitos do passado. Isso é mudança?!

Quanto à questão do limite de uso das viaturas do estado (para mim, a medida mais demagógica e populista desse governo, por ser de todo, incoerente e impraticável), num país em que o nível salarial é o que se sabe, o uso de viaturas do estado, de motorista, de segurança e até de casas do estado ou a atribuição de subsídio de habitação, além de servirem para dar alguma dignidade aos altos cargos públicos, tem que ser visto como um complemento salarial e uma medida de desencorajamento à corrupção, ainda mais no caso em concreto, em que muitos ministros e altos funcionários do estado não têm casa e viatura próprias. Creio que se o objectivo era agradar ao povo e mostrar uma atitude de responsabilidade na gestão da coisa pública, nesse item, os anunciados cortes no combustível e telefone estavam de bom tamanho, até porque como se veio a provar, essa medida não era de fácil implementação, por isso, inventaram as tais excepções e as credenciais de autorizações pontuais, que com o tempo, acabaram (as excepções) por se transformar em regra. Sem falar que os fiscalizadores, são subordinados hierárquicos dos fiscalizados, logo, a ameaça de represálias não lhes permite cumprir a sua função com o zelo exigido. Por tudo isso, essa medida estava desde o inicio ferida de impraticabilidade, mas foi anunciada com pompa e circunstancia e granjeou muita simpatia junto do povo pequeno, mas hoje, com ou sem credenciais, os carros do estado circulam a todas às horas e em todos os locais. Isso é mudança?!

Depois tivemos o célebre caso do deputado 28 na votação para a presidência da Assembleia Nacional, que nos fez perceber as razões do ADI não ter passado cartão à oposição na formação do seu governo minoritário, afinal, já tinham garantido a fidelidade canina de um dos deputados do MLSTP/PSD, que, contando com o deputado solitário (e solidário) do MDFM, lhes assegura a tão ambicionada maioria absoluta no parlamento. A prova maior desse pressuposto foi dada na elaboração do OGE para 2011, onde mais uma vez, a oposição não foi tida, nem achada no processo. Em que País sério do mundo, um governo minoritário elabora um orçamento sem negociar previamente com um ou mais partidos da oposição para ter garantias que o seu orçamento não seja chumbado?! (vejamos o exemplo de Portugal, onde o governo minoritário do PS teve que se vergar à algumas exigências do maior partido da oposição para ter garantias prévias de que o seu orçamento não seria chumbado no parlamento). Das duas, uma: Ou o primeiro-ministro é um irresponsável, temerário e está a abusar da sorte, ou tem mesmo um trunfo na manga, nesse caso, um deputado na manga. Isso traz-nos à memória os célebres encontros que aconteceram na “Favorita” no tempo do governo minoritário do Tomé Vera cruz, onde a ementa principal foi a compra dos deputados do ADI (ironia do destino). E já que falo do OGE, não será demais recordar que o senhor Patrice Trovoada assinou publicamente um compromisso com os habitantes da ilha do Príncipe onde garantia que se fosse governo, a RAP não seria esquecida e 10% do OGE seriam disponibilizados para alavancar o desenvolvimento de umas das mais esquecidas regiões do País. Esse acto valeu-lhe o apoio incondicional do UMPP de Tozé Cassandra, 40% dos votos e a eleição de 2 deputados na RAP. Agora sabemos que a dotação para a RAP no OGE de 2011 está longe do prometido e até é inferior ao valor do orçamento de 2010. Isso é mudança?!

Por último, uma pequena nota sobre o assunto do momento (que merecerá maiores comentários no próximo texto), que é o “São Lima gate”: O primeiro-ministro, o ministro da tutela e o director da TVS, que são os principais visados, ainda não se dignaram vir a publico dizer uma palavra sobre o assunto, remetendo a sua versão dos factos para uma espécie de comunicado publicado no site do ADI. O partido político no poder começa a confundir-se com o estado. Onde é que já vimos esse filme?! E isso parece-vos mudança?!

(continua)

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