sábado, 28 de fevereiro de 2009

PRESIDENCIALISMO!? PORQUE NÃO?

Em consequência dos últimos acontecimentos políticos em São Tomé e príncipe, veio a baila mais uma vez a velha questão do sistema de governo que mais se adapta à nossa realidade.

Naturalmente que se fizermos um exercício de reflexão sobre o que tem sido esses 18 anos do sistema Semi-presidencialista em STP (até 2003 com um pendor mais Presidencialista e depois com um pendor mais Parlamentarista), o resultado é catastrófico a todos os níveis, sendo que ainda não se conseguiu descortinar sem margem para duvidas se o mal está no próprio sistema, que não se adequa de todo à nossa realidade ou se está nos autores políticos que muitas vezes atropelam as normas instituídas, por incompetência, por negligencia ou por pura má fé.

Muitos afirmam peremptoriamente que o mal está nos nossos autores políticos, evocando o exemplo de outros Países que enveredaram pelo Semi-presidencialismo com resultados bastantes satisfatórios a nível do funcionamento e da coabitação entre os órgãos do poder político, esquecendo-se que, embora o sistema seja universal, cada País tem as suas particularidades próprias e temos que ter em conta vários factores que podem influenciar de forma significativa a boa implementação pratica dos “princípios teóricos” desse sistema de governo: A própria história do País e do seu povo, a cultura politica dos seus dirigentes, o nível de maturidade das instituições democráticas, a situação económica do País, o nível de alfabetização do seu povo, a competência e a clarividência dos seus políticos, a situação do sistema Judiciário, e.t.c, e.t.c

Outros defendem que dada a nossa “pequenez” em termos de território e de população, o sistema Semi-presidencialista não é o mais adequado e que muitos dos focos de instabilidade que têm assolado STP se deve a algumas lacunas que o sistema apresenta em termos de equilíbrio de poder entre os órgãos políticos.

A verdade é que, seja por culpa do sistema, seja por culpa dos politicos ou até por culpa dos dois, as coisas não têm funcionado a nivel da divisão de competencias e de poderes, e temos assistido nesses anos todos sucessivas crises políticas em resultado de "querelas" entre os orgãos de soberania que têm assassinado de forma implacável as esperanças de desenvolvimento do nosso São Tomé e Príncipe.

Já experimentamos o Presidencialismo totalitário e absolutista e o País não “arrancou”. Já experimentamos o Semi-presidencialismo com poderes alargados para o Presidente e o País voltou a não “arrancar”. Limitou-se os poderes do Presidente numa tentativa de “remediar” o sistema e o País teima em não “arrancar”. Tivemos Presidentes e Governos de diferentes quadrantes políticos e os “casamentos de conveniência” acabaram todos em divórcios litigiosos. Tivemos Presidentes e Governos do mesmo quadrante político (Trovoada/PCD e Fradique/MDFM) e a coisa voltou a não funcionar, caindo por terra o velho mito de que um Presidente e um Primeiro-ministro da mesma cor politica iriam se entender às mil maravilhas. Certamente que os problemas de São Tomé e Príncipe não se resumem apenas ao sistema de governo ou à qualidade (ou falta dela) dos seus políticos, mas creio que uma parte significativa desses problemas “desapareceriam” se conseguíssemos resolver a questão da má governação e dos desentendimentos entre os órgãos de soberania. O que fazer então?

Naturalmente que não conseguiremos mudar os autores políticos todos, pelo menos ao mesmo tempo, então talvez seja altura de experimentar uma mudança a nível do sistema de governo e nesse campo, devo confessar que pela primeira vez estou de acordo com o nosso Presidente: O Presidencialismo pode sim, ser uma saída viável. Não o sistema Presidencialista universal pré concebido, mas um sistema Presidencialista adaptado à nossa realidade de forma a não cairmos outra vez no equívoco de “importar” um sistema novo sem tentar ajusta-lo às particularidades do nosso País e do nosso povo.

Um Presidencialismo em que em termos gerais, o Presidente tivesse o poder executivo e fosse eleito para mandatos de 4 ou 5 anos renováveis, o Supremo tribunal, o poder judiciário em que os juízes fossem nomeados para um mandato único de 6 a 9 anos e o Congresso ou Parlamento, o poder legislativo com mandatos de 4 a 5 anos, sendo que o Presidente não podia dissolver o Congresso em hipótese alguma, cabendo essa prerrogativa ao poder Judiciário (dentro de normas a serem estabelecidas) e onde o congresso pudesse demitir o Presidente em situações de crime, abuso de poder ou violação das normas constitucionais.

Um Presidencialismo onde também fosse eleito um Vice-presidente, para que em caso de morte ou destituição do Presidente, o Vice seja chamado a levar o mandato até ao fim, sem ter necessidade de outras eleições (caso não seja acusado, também ele) e em que o Vice-presidente possa ocupar uma das pastas do gabinete do Presidente ou possa ser o Presidente do Congresso, para que a sua função não seja meramente decorativa.

Um Presidencialismo em que fosse eleito um Congresso ou Parlamento com um máximo de 31 Congressistas ou Deputados, em círculos plurinominais e em que os eleitos seriam funcionários públicos a tempo inteiro, bem renumerados e proibidos de exercer qualquer outra função pública ou privada.

Um Presidencialismo em que os candidatos aos cargos de Presidente, Vice-presidente e Deputado, fossem previamente escrutinados pelo Supremo Tribunal de justiça de forma a não termos “delinquentes” candidatos aos mais altos cargos públicos da nação; onde os indigitados para as pastas do Gabinete do Presidente passassem por um rigoroso processo de “crivagem” no Congresso de forma a evitar as ligações perigosas e o compadrio que se tem verificado nas relações entre o sector publico e o privado e onde todos os titulares de cargos públicos fossem obrigados a apresentar as suas declarações de rendimentos antes de assumir os respectivos cargos.

Um Presidencialismo onde fossem estabelecidas clausulas barreira no sistema eleitoral de forma a limitar a proliferação de partidos políticos, contribuindo para uma maior estabilidade interna e também fazer baixar o valor total das subvenções do estado aos partidos...

Acredito que, pelos motivos aqui evocados e por tudo mais, é chegada a hora de se debater seriamente a questão do sistema de governo em STP e embora seja a Assembleia Nacional o órgão constitucionalmente competente para o efeito, a sociedade civil e os restantes autores políticos não podem assistir a esse processo de braços cruzados, privando-se de se fazerem ouvir num tema tão importante para o futuro do nosso São Tomé e Príncipe.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

CRONICA DE UM GOLPE DE ESTADO ANUNCIADO.

Mais uma vez acordamos um dia desses com notícias sobre um possível golpe de estado em São Tomé e Príncipe ou como se diz no “politiquês” corrente: A tentativa de inversão por via mais ou menos violenta da ordem constitucional no País.

Se a memoria não me atraiçoa, esta é a 5ª vez que tal fenómeno se verifica no São Tomé e Príncipe Democrático, sem contar com aquela brincadeira de mau gosto que o Afonso Costa protagonizou em 1986, no tempo do partido único, quando tentou “tomar” o País com duas dúzias de indivíduos em canoas de remos (ou será que eram a motor?) “armados até aos dentes” com machados, zagaias, “francotes” e uma ou duas armas de verdade, escudados na perícia militar de um ex – mercenário “búfalo” com nome de herói de banda desenhada. A diferença é que desta vez, ao que parece, os nossos serviços de informação (soa à Americano, não é?) lá descobriram a tempo a tramóia e impediram, até ver, aquela que seria a 5ª tentativa de golpe de Estado em STP em 18 anos de Democracia. Incrível! 4 Tentativas de golpe de Estado e 1 quase tentativa em 18 anos de Democracia. Há anos que andamos a competir ferozmente para o título de País com o maior o maior número de Primeiros-ministros e Ministros por m2, ao que parece, acabamos de lançar com algum mérito, a nossa candidatura ao titulo de País com o maior numero de tentativas de golpe de Estado por década.

Falo em tentativas, porque não passaram disso mesmo: Tentativas! Com maior ou menor alvoroço, com mais ou menos tiros disparados, com mais ou menos dirigentes sequestrados, tudo acaba em alguns dias e voltamos todos às nossas vidinhas com os donos do poder a permanecerem de pedra e cal nos seus tronos, como se nada se tivesse passado, não se verificando na pratica a tal “inversão da ordem constitucional no País”. Tudo fica resolvido depois de decretadas as amnistias gerais da praxe para os “delinquentes” e assinados os famosos memorandos de entendimentos, onde se define a atribuição de algumas benesses aos cabecilhas da quadrilha, como compensação por terem abdicado do poder temporariamente conquistado, uma espécie de indemnização por potenciais danos patrimoniais, que vão desde parcelas de terra, casas, carros à bolsas de estudos no exterior, fazendo assim prevalecer a velha máxima de que o crime compensa ou melhor, tentar dar golpe de Estado em STP, compensa bué!

Por tudo isso, não me espanta que sejamos outra vez confrontados com essa realidade e muito menos me espanta que estejamos na presença de "alunos" repetentes, que mais uma vez, carregando a bandeira dos fracos e oprimidos, vêm se escudar na defesa dos interesses do povo para desestabilizar as instituições publicas, esperando como sempre, colher dividendos nas negociações futuras, com o beneplácito da comunidade internacional. Se lhes correu tão bem em 2003, porque razão esperariam um cenário diferente desta vez? É esse o resultado das políticas de “mão branda” para quem atenta de forma tão grave contra a autoridade do estado que se tem vindo a praticar em STP. É esse o resultado da ausência de punições exemplares nas outras vezes em que nos vimos nas mãos desses mesmos infractores, por receio de sei lá o quê, com medo de sei lá quem. Enquanto a justiça em STP continuar a passar essa imagem de impotência e inoperância, enquanto a autoridade do Estado não for reposta de forma afirmativa e inequívoca, não me parece que essa seja última vez em que nos deparamos com situações destas.

Resta-nos aguardar as cenas dos próximos capítulos, para confirmarmos se realmente estamos perante uma tentativa fracassada de golpe de Estado e neste caso, esperar uma reacção nada benevolente por parte dos órgãos da justiça São-tomenses ou se estamos na presença de uma operação de fachada montada de forma “hollywoodesca” para salvaguardar alguns interesses económicos de um grupo de pessoas, como muitos sugerem, por causa da questão dos terrenos da lagoa azul e do tal casino ilegal que funcionava a vista de todos, com a devida conivência dos órgãos de justiça de STP e só agora foi fechado. Quem viver, verá!

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

REFLEXÕES SOLTAS I - EUTANASIA v.s CASAMENTO HOMOSSEXUAL

Ao lerem o título desta crónica, naturalmente que vos vem a cabeça perguntas do tipo: Que raio tem a ver uma coisa com a outra? O quê que o suicídio assistido tem a ver com a legitimação perante a lei dos homens de uma relação amorosa entre duas pessoas do mesmo sexo? Talvez nada. Talvez tudo.

A abordagem simultânea que faço a dois temas tão distintos e polémicos nas sociedades actuais não é de todo inocente. Numa semana em que acompanhamos a situação de Eluana Englaro, uma mulher Italiana que após 17 anos ligada às maquinas em estado vegetativo e 10 anos de infindáveis batalhas politicas, religiosas e judiciais, viu finalmente confirmado pelo supremo tribunal Italiano “o seu direito à morte assistida” e onde ficamos a conhecer a intenção do secretário-geral do PS e Primeiro ministro de Portugal, José Sócrates, em levar ao congresso do seu partido uma moção de orientação política onde propõe "a remoção de barreiras jurídicas à celebração do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo”, dei comigo a pensar seriamente nesses dois assuntos sérios, assistindo as discussões infindáveis que esses temas fracturantes normalmente fazem eclodir nas sociedades de hoje e observando mais uma vez as ligações perigosas que ainda persistem entre a politica e a religião. Como normalmente faço nas poucas vezes que penso seria e profundamente em algum assunto serio, vesti a pele das partes interessadas e cheguei à conclusões “interessantes”:

1 – Se eu fosse um gay ou uma lésbica, de certeza que me agradaria muito poder usufruir do direito que qualquer pessoa tem nas sociedades civilizadas de se casar com quem bem lhe apetecer, seja por amor, pela atracão física ou até mesmo pela atracção financeira.

2 – Se eu estivesse confinado a uma cama de hospital durante alguns anos, como consequência de um azar qualquer que tivesse na vida (toc, toc na madeira) ligado às maquinas em estado vegetativo, sem esperanças de recuperação e aguardando pacientemente o dia da minha morte, toda a minha alma agradeceria profundamente à pessoa que generosamente pusesse fim a esse sofrimento e acabasse com o desgaste físico e mental a que estaria sujeito, “libertando” também a minha família e amigos mais próximos desta pesada cruz.

3 – Se eu fosse um politico populista numa sociedade conservadora, um membro efectivo ou simples adepto ferrenho de uma qualquer religião, apegado aos dogmas bíblicos ou apenas um cidadão tacanho que se recusa a aceitar as mudanças sociais que têm acontecido no nosso dia-a-dia, com certeza que abominaria a ideia de duas pessoas do mesmo sexo poderem ver a sua situação de união “anormal” amparada nos braços da lei.

4 – Se eu continuasse a ser o mesmo politico populista numa sociedade conservadora, o mesmo membro ou praticante ferrenho de uma qualquer religião, de certeza absoluta que defenderia solenemente a premissa suprema de que só devemos deixar esse mundo quando e como o SENHOR entender e nunca antes da altura “marcada” e muito menos por interferência de outro qualquer pecador. Ah, se eu tivesse um familiar próximo ou um amigo chegado confinado a uma cama de hospital, ligado a uma máquina sem hipóteses de recuperação, de certeza que travaria dentro de mim uma luta acesa entre o “aceitar” que se terminasse com o seu sofrimento, mesmo a pedido dele e o “lutar” para que ele se mantivesse vivo, mesmo em situação precária, apenas para suprir o desejo egoísta que todos temos de querer ter as pessoas que nos são queridas perto de nós e entre nós.

Como sempre acontece quando nos “metemos” na pele dos interessados em questões de consciência, acabamos por não chegar a conclusão nenhuma, porque cada um tem os seus motivos, as suas crenças, os seus interesses e as suas próprias experiencias para sustentar o seu ponto de vista ou a sua intransigência. Eu pessoalmente acho que nas duas situações em análise, por se tratar de questões de consciência, acima das politiquices e dos dogmas caducados da igreja, devia prevalecer o nosso livre arbítrio, sustentado naturalmente na premissa maior de que “ a nossa liberdade termina onde começa a do outro”. Podemos não concordar com o casamento homossexual, ou melhor, podemos até não achar muita piada à relação homossexual em si, mas temos que aceita-la como facto consumado nos dias que correm e respeitar os que seguiram por essa via. Podemos achar eticamente imperdoável que uma pessoa em qualquer circunstancia possa por fim a sua própria vida ou pedir a outros que o façam por ela, mas temos que entender que há momentos especiais na vida em que a própria vida torna-se sofrida e sem significado, por isso temos que aceitar e respeitar que o “dono” dessa vida decida acabar com ela como forma de por fim ao seu sofrimento.

Naturalmente que não defendo o livre arbítrio cego e desgovernado, porque como seres sociáveis, não seriam raras as situações em que o nosso livre arbítrio fatalmente acabaria por entrar em colisão com os direitos de outrem ou com as regras instituídas, logo, nos dois assuntos em questão, caberia aos políticos, deixarem de lado a hipocrisia e definir as regras que levassem as pessoas a poderem optar por aquilo que mais lhes conviesse em cada um dos casos. Se é ponto assente que cada vez mais há casais homossexuais assumidos, se muitos inclusive já começam a “juntar os trapinhos”, porque não lhes dar o direito de ver essa relação reconhecida perante a lei? Se há casos de pessoas em estado vegetativo que acabam por falecer repentinamente em circunstancias obscuras, por conta da piedade de um medico ou enfermeiro, porque não permitir de uma vez por todas que essas pessoas tenham um final de vida digno? Por que não definir regras para evitar os equívocos que as vezes acontecem e que custam a vida de muitos que se calhar foram mal diagnosticados e careciam de uma segunda opinião competente? Porque continuar a tapar o sol com a peneira e fazer de conta que nada se passa?

Foi assim na questão do aborto, que mesmo proibido por uma lei conservadora e moralista, acontecia em cada clínica clandestina desse País em condições precárias e continua a acontecer em cada clínica clandestina desse mundo fora, nos Países onde os políticos ainda não foram “iluminados” para perceberem que a melhor solução para esse fenómeno é a sua legalização e o estabelecimento de programas de informação e acolhimento para evitar as milhares de mortes e os inúmeros problemas que padecem as mulheres que recorrem a esses lugares.

È assim na questão da prostituição, que mesmo “proibida”, continua a proliferar em cada cidade e bairro desse País, enriquecendo pessoas de má índole e permitindo também o aumento de “mazelas” sociais como o tráfico de mulheres, o tráfico de droga e as doenças sexualmente transmissíveis. Todos sabem que a prostituição existe, deparamos com ela nas páginas dos classificados dos jornais, nas ruas, em bares de alternes e em casas de striptease, então porque não legalizá-la de uma vez por todas? Porque não transformar essas mulheres e homens em trabalhadores honrados que cumpram com as suas obrigações fiscais como todos os outros contribuintes? Porque não regulamentar o sector de forma a acabar com os “chulos” e instaurar a obrigatoriedade da inspecção médica?

Pese embora os conflitos de ordem moral que possam existir nas questões que frisei, penso que seria de todo útil que houvesse coragem politica para regulamentar aquelas situações que temos como casos consumados, de forma a evitar que as pessoas continuem a agir fora dos braços da lei e permitir que cada um possa optar por aquilo que quer, de acordo com a sua consciência.

Legalizou-se o aborto e quem é contra o aborto pode continuar a ser contra, resguardado nos seus princípios éticos, mas deu-se hipótese aos que são a favor de poderem optar por uma saída segura. Legalize-se então o casamento homossexual e a eutanásia. Os que são contra, poderão continuar a ser contra, bastando que se abstenham de exercer esses direitos, mas ao menos daremos aos que estão a favor o direito de poderem optar sem estar a cometer nenhum tipo de crime. Creio ser esta, a essência da cidadania.