terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

NO PAÍS DOS "BRINCA - NA - AREIA"

Nota prévia: “Brinca – na - areia”, na gíria do futebol, é o nome dado aos jogadores tecnicistas e talentosos que normalmente empolgam o publico e dão espectáculo com os seus dribles e jogadas mágicas, mas que na prática, pouco ou nada produzem em prol da equipa. São individualistas, egoístas, pouco dados aos rigores da disciplina táctica e alheiam-se das jogadas assim que perdem a bola, não ajudando a equipa quando ela tem que defender. Fazem desesperar os companheiros de equipa e contribuem de forma objectiva para a subida da tensão arterial de qualquer treinador, mas, por incrível que pareça, é deles que o povo gosta.

Ultimamente, cada vez que oiço ou leio notícias sobre o nosso São Tomé e Príncipe, lembro-me das palavras do senhor Procurador-geral da Republica quando foi ouvido na 5ª comissão da Assembleia Nacional há umas semanas atrás: “Nesta República democrática, andamos todos a brincar uns com os outros””, afirmou ele, do alto da sua perspicácia intelectual, todo feliz da vida, por ter chegado a uma conclusão que nos tem escapado esses anos todos. Na altura registei com agrado o facto do nobre Procurador-geral não se ter excluído do grupo dos brincalhões. Só por isso, subiu uns pontos na minha consideração. O facto é que 35 anos depois da nossa independência, temos uma nova teoria para explicar o nosso falhanço enquanto nação soberana: Sofremos todos do complexo de Peter Pan, ou seja, não nos fizemos HOMENS e continuamos a olhar o País como se fosse a nossa casinha de brincar! Já agora, convém sublinhar que também não me excluo do lote dos brincalhões, porque se uns têm usado e abusado das brincadeiras, em muitos aspectos, os que assistem impávidos e serenos e pouco ou nada fazem para inverter a situação, têm também a sua cota parte de responsabilidade nesse brinca – brincando colectivo. Portanto, podemos dividir a classe dos brincalhões entre os activos e passivos. Trocando por miúdos ou melhor, falando em “futebolês” corrente: Há os “brinca – na – areia”, que vão ludibriando a torcida com o seu arsenal de dribles e jogo de cintura, e há o povo carneiro que os aplaude e os promove à ídolos instantâneos, não se apercebendo que a equipa, enquanto um todo, se vai afundando num mar de derrotas consecutivas.

Mergulhando de cabeça nessa tese que o iluminado Procurador – geral trouxe ao debate, constatamos numa primeira analise que, infelizmente, as brincadeiras que vão acontecendo no nosso País, já não têm nada a ver com o tradicional jogo de bola de peúga num terreno baldio qualquer, nem com inocente jogo de lata ou o saudoso (e saudável) “papá com mamã” (brincadeiras realmente infantis e inocentes). Hoje em dia, ancorados nas pranchas do progresso e do desenvolvimento tecnológico, a que se junta a ambição desmedida e um sentido de impunidade afinadíssimo, andamos mais virados para a Batalha naval, pôker, Age of Empires, Paradise gangsters ou o Comand & Conquer e similares, todos eles, jogos de estratégia, de conquista de poder e de usurpação de recursos de outrém (financeiros, naturais, humanos e.t.c). Os nossos brincalhões, hoje em dia, são pois, peritos na arte de manipular, fazer batota, roubar, enganar, explorar e sobretudo, não olham aos meios para atingirem os fins preconizados. Trocando agora por graúdos: A expressão máxima da tese da “brincadeira” em termos objectivos, é a facilidade com que nos entregamos às politiquices e às intrigas “palacianas” e confundimos as relações institucionais com as relações pessoais, dando sistematicamente mais valor às segundas, para o bem e para o mal e, qual meninos mimados, estamos sempre a fugir às nossas responsabilidades e deveres, colocando a culpa de tudo que está errado nos outros, assumindo apenas a paternidade das coisas boas, que vão sendo cada vez mais raras, diga-se de passagem. Noutro patamar, estamos sistematicamente a empolar o que é acessório e secundário, relativizando ou mesmo negligenciando por completo o que é realmente importante, sem falar do facto da nossa sociedade encontrar-se super politizada em todos os níveis e estratos sociais, o que fatalmente acaba por amordaçar o nosso pensamento crítico e corromper o nosso discernimento. Hoje em STP, muito pouca gente consegue pensar e emitir opiniões sobre o País com total independência partidária e menos ainda o conseguem fazer de forma frontal e responsável, sem se esconderem no anonimato dos panfletos, dos fóruns de discussão on line ou no agora, muito em voga, espaço de comentários do jornal “Tela non”. A política tornou-se o factor determinante na vida das pessoas e sobrepõe-se até às relações familiares, comerciais e institucionais. O que conta acima de tudo em STP é saber se alguém “é nosso ou não”. Se somos de um determinado partido e queremos "safar a nossa tese", avalisamos e defendemos suinamente tudo que esse partido faz, esteja certo ou errado e condenamos e criticamos tudo que os outros partidos fazem, estejam certos ou errados. Se o partido da nossa simpatia está no governo, tudo o que faz de errado é culpa do governo anterior ou são manobras da oposição para criar instabilidade política e não os deixar trabalhar. Ou seja, os nossos correligionários passam a ser os melhores e os maiores em tudo, autênticos paladinos da verdade e os únicos que querem trabalhar para o povo, a quem não conseguimos, em circunstância nenhuma, reconhecer incompetência, burrice ou má fé. O mérito e a competência apenas são elogiados e reconhecidos quando nos convém ou quando servem os nossos desígnios partidários, caso contrário, arranjamos logo um pequeno defeito para empolar o nosso tradicional “bota – abaixismo” ou lançamos boatos e inventamos calúnias para esconder a inveja latente, que nos impede de conviver com o sucesso dos outros, mesmo que esse sucesso tenha impacto significativo na concretização dos nossos anseios colectivos. E o pior é que somos facilmente manipulados pelos caciques da tribo, que, de forma sistemática e leviana vão fomentando e perpetuando esse tipo de situação, usando e abusando do populismo barato e de jogadas de bastidores para ir semeando a discórdia e a confusão entre o pessoal da plebe, descredibilizando pessoas, instituições e, pasme-se, órgãos de soberania, de tal forma que as vezes, torna-se quase impossível distinguirmos “os artistas” dos “chefes de bandido” nos jogos de estratégia que vamos assistindo em STP.

Para mal dos nossos pecados, nesses últimos tempos, o que não tem faltado são exemplos que continuam a confirmar essa “risonha” realidade. Os “brinca – na – areia” continuam a dar o seu show, a empolgar o povo e a ludibriar os adversários, com as suas fintas estonteantes, pontapés de bicicleta e cruzamentos de trivela. O engraçado é que olhamos para o Placard e por baixo do nome da nossa equipa vislumbramos um expressivo 0 (zero). Golos que é bom, nada! Resultados positivos, que é o que se espera, nem vê-los! E já andamos há 35 anos nessa brincadeira.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

"O POVO É QUEM MAIS ORDENA"

Zeca Afonso celebrizou essa frase na música que despoletou, por assim dizer, a revolução dos cravos no dia 25 de Abril de 1974, que, como sabemos, derrubou a ditadura do Estado Novo e fez implantar a democracia em Portugal. O ano de 2011 trouxe-nos (para já), mais dois exemplos que confirmam a validade intemporal dessa premissa: Os povos da Tunísia e do Egipto, empolados por uma necessidade desesperada de melhoria das suas condições de vida e simultaneamente, pela vontade frenética de abraçar e vivenciar os preceitos da democracia representativa, saíram às ruas e ORDENARAM o fim dos regimes ditatoriais do Ben Ali e Hosni Mubarak que os governavam há 23 e 30 anos, respectivamente. O efeito de contágio dessas corajosas acções é já inegável e irreversível e, embora muitos outros ditadores daquela zona de África (e não só) comecem a precipitar a implementação de algumas reformas “ de fachada” nos seus regimes, creio que não tardará muito para que a revolução também lhes bata à porta, ou melhor, lhes entre pelo palácio dentro, sem bater à porta e sem pedir permissão, como aliás, deve ser apanágio de uma “boa” revolução.

Ao assistir o desenrolar desses acontecimentos, não pude resistir à tentação de imaginar um cenário semelhante no nosso São Tomé e Príncipe e essa tentativa de dar asas às ilusões esbarrou logo numa questão fundamental: Será que nós, São-tomenses, seriamos capazes de nos congregar em volta de um objectivo ou sonho comum de forma a forçar a criação de condições para torna-lo realidade?! Duvido muito, mas, embora pareça contraditório, quero acreditar que seja possível. Já perceberão porquê.

Naturalmente que a nossa revolução, a acontecer, não seria para conquistar a independência ou a democracia, porque essas, com maior ou menor sacrifício, com maior ou menor luta, já as conquistamos e, com maior ou menor expressão, já as vivemos. Mas nós, enquanto povo de um País consecutivamente adiado, com problemas estruturais graves, sentimos que ainda temos muitas conquistas a fazer e certamente muitas delas requererão a emergência de uma alma revolucionária que até hoje tem andado perdida ou subjugada pela pacatez e comodismo que caracteriza o homem São-tomense, cuja expressão máxima podemos encontrar no nosso tão falado “leve – leve”, que, consciente ou inconscientemente, adoptamos como filosofia sagrada da nossa existência. “Leve – leve” para tudo, “leve -leve” sempre.

Noutro patamar, como ficou mais uma vez provado na Tunísia e Egipto, uma revolução para ser bem sucedida carece de 5 ingredientes fundamentais: União, altruísmo, coragem, sacrifício e perseverança. Ou seja, exactamente todas as características que desapareceram (ou nunca chegaram a fazer parte) do ADN da maior parte do povo São-tomense. Somos egoístas; somos desunidos; somos invejosos; somos cobardes e poucos dados à sacrifícios, principalmente à sacrifícios colectivos. E se juntarmos à tudo isso, a facilidade com que actualmente se vende e se compra consciências no nosso País, concluímos que qualquer tentativa para desencadear uma revolução morre logo à nascença. Senão vejamos: Em STP, se alguém tiver a brilhante ideia de “inventar” uma revolução, o nosso tradicional comodismo o convence logo a desistir, dizendo que não vale a pena lutar, que as coisas não vão mudar. E se ele for teimoso e quiser mesmo assim avançar, terá sérias dificuldades em arranjar apoiantes para a sua causa, mesmo que ela seja uma causa colectiva. Se por um passe de magia, conseguir convencer os outros a juntarem-se à ele e avançar com os protestos na rua, a nossa cobardia nos fará recuar assim que a polícia de choque aparecer, ou, no limite, assim que alguém levar com um cassetete no lombo ou um tiro intimidador for disparado para o ar pelas “forças opressoras”. Se mesmo assim, houver pessoas decididas à darem o corpo ao manifesto, como quem diz, à dar o lombo aos cassetetes e o peito à balas, sacrificando-se por um bem maior, o nosso egoísmo e desunião falará mais alto e acabaremos por nos dispersar de imediato, todos contentes por não termos maculado o nosso querido lombinho. E se mesmo assim, num cenário já utópico, decidirmos continuar com a revolução e enfrentar unidos, todas as consequências desse acto corajoso, o poder instituído chamará os cabecilhas da coisa para uma reunião à porta fechada e lhes acenará com uns tostões em troca da rendição incondicional (se calhar isso acontecia assim que o nosso revolucionário conseguisse juntar uns gatos pingados e ameaçasse fazer barulho). Saiam todos contentes do tal encontro, recolhiam os megafones e cartazes, se os houvesse, anunciariam aos outros coitados o fim da revolução e dirigiam-se para o bar mais próximo, onde iam vangloriar-se da sua esperteza saloia e gastar parte do dinheiro arrecadado na comemoração, que hoje em dia é sinónimo de “ comer água” como se não houvesse amanha. É por tudo isso que tenho sérias dúvidas que sejamos capazes de nos “revolucionar” como mandam as regras.

Por outro lado, se quisermos ser optimistas, sob certa perspectiva, podemos afirmar que em São Tomé e Príncipe já vai havendo uma espécie de “minis revoluções” de tempos em tempos, a título individual ou envolvendo pequenos grupos de pessoas, embora o facto de não serem acções consertadas de massas, lhes confira por ora, o redutivo título de “pequenos motins”: Os protestos sobre a falta de água e luz em determinadas zonas; Os protestos sobre a falta de géneros de primeira necessidade no mercado ou sobre o aumento dos preços dos mesmos; Os protestos sobre a situação da justiça; Os protestos contra a exagerada cedência de roças e terrenos aos políticos, também em determinadas zonas; Manifestações de determinados sectores da sociedade (ora jovens, ora motoqueiros, ora funcionários públicos, ora palaiés) e.t.c. Todas essas “minis revoluções”, na sua essência, têm se revelado inócuas e infrutíferas, já que são efémeras, dispersas no espaço e no tempo, não conseguem mobilizar a opinião pública de forma sustentada e duradoura e, são facilmente reprimidas, por acção da policia, pela intimidação politica ou pela força do dinheiro. Sem falar que na prática, nada de concreto conseguem alcançar, além do sistemático renovar de promessas. De qualquer forma, é por esses pequenos laivos de indignação sectorial que quero acreditar que o nosso espírito reivindicativo não está totalmente morto e que sim, que podemos nos congregar em torno de um desígnio nacional e nos “revolucionar” de verdade, como um povo que ORDENA e constrói o seu futuro, caso a situação do País venha a tornar-se realmente incomportável. Continuemos então, com as nossas “minis revoluções” e quem sabe um dia, com a prática, conseguimos dotar-lhes dos elementos necessários para que elas se tornem GRANDES. Acredito que a próxima tenha já data marcada para finais de Julho, nas eleições presidenciais. Vamos ver se o dinheiro continua a falar mais alto do que o nosso amor à pátria.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

DESPORTO ESCOLAR: UMA NECESSIDADE URGENTE.

Na semana passada, uma boa notícia fez-me viajar por alguns dos momentos felizes da minha adolescência e num exercício de pura nostalgia, deliciei-me com as lembranças de capítulos, pessoas e lugares que me marcaram nessa vida. Falo do regresso do desporto escolar aos estabelecimentos de ensino de São Tomé e Príncipe, anunciado pelo Secretario de estado da juventude e desporto. O desporto escolar no meu tempo, envolvia muitas valências e varias modalidades, mas a sua vertente competitiva a nível do futebol era sem dúvida, a parte mais apetecida. Quem viveu a experiencia dos campeonatos de futebol 5 inter-turmas nas escolas secundárias, saberá certamente do que falo e não deixará de sentir uma certa saudade dos momentos de camaradagem, união e convívio que esses campeonatos nos proporcionaram, além do natural amor à prática do desporto, que esses jogos despertavam na malta jovem.

Lembrei-me primeiro da minha turma da 6ª classe, na ex-Associação dos socorros mútuos na Trindade, uma espécie de posto médico abandonado que durante alguns anos foi transformada em escola secundária improvisada com 5 salas de aulas. A turma G era a turma dos mais velhos, quase todos repetentes e apenas por um atraso no processo da minha transferência de Luanda, fui para lá remetido. Ainda bem. No campeonato do ano lectivo 88/89, a nossa turma dominou e “massacrou” os adversários, terminando a competição só com vitórias, tanto no sector masculino, onde pontificava o Kichu, jovem talento que mais tarde chegou mesmo a envergar a camisola da equipa principal de futebol 11 da Trindade, como no sector feminino, onde davam cartas, a Alcinda “mulata”, ponta de lança mortífera e uma guarda-redes aguerrida que defendia tudo que havia para defender, cujo nome não consigo recordar. Na altura, a timidez em mostrar os meus dotes futebolísticos em público e o excesso de craques, impediram-me de fazer parte da equipa. Como era o benjamim da turma, tive que contentar-me com a posição de homem da logística (vulgo, “aguadeiro”). Os fins-de-semana de competição eram uma festa que apenas por motivos maiores alguém falhava. Assistíamos os jogos, ríamos, brincávamos, gozávamos com os adversários, as vezes zangávamo-nos, mas no fim, éramos todos felizes.

Lembrei-me depois da minha turma da 7ª classe, ainda na ex-Associação dos socorros mútuos. No sector masculino, a turma B já não foi tão bafejada pela sorte no que toca ao talento futebolístico, por isso, no campeonato do ano lectivo de 89/90 ficamos nos últimos lugares, embora me lembre do nosso esforçado guarda-redes, o Hermes, de Monte Café, cujas exibições impediram-nos de levar várias “cabazadas” e que mais tarde, tornou-se titular da equipa de futebol 5 de Belém. No sector feminino, à Alcinda, juntaram-se a Carla e a Joly, formando um trio de respeito que foi impedido de celebrar a vitória no campeonato pela batotice do professor de edução física, árbitro da final que jogamos com a 7ª C, a turma da qual ele era director. Desses tempos, lembro-me sobretudo que os dias de jogo eram também pretexto para as raparigas saírem de casa para os namoricos e, dos momentos de diversão que passávamos no “Vasco”, um “fundo” de um riacho que passava por trás da escola nova da Trindade, cujo nível relativamente raso da água não nos impedia de “dar cabeça fundo” com toda propriedade. No final dos jogos, era no “Vasco” que íamos festejar as vitorias e amargurar as derrotas e lá, adversários de ocasião transformavam-se todos em companheiros de brincadeiras e éramos todos felizes. Ah, lembrei-me também do “matraquilo” velho do senhor Ministro (era esse o nome do homem), em Uba-flôr, para onde muitas vezes transportávamos a saudável rivalidade inter-turmas em torneios improvisados. Uma “mão”, custava na altura 20 dobras. Bons tempos!

Lembrei-me também da minha turma da 8ª classe, já na “escola nova” e por incrível que pareça, passados quase 20 anos, ainda sei os nomes de quase todos os meus ex-colegas ex-professores da turma A. Sinal de que as memorias daqueles tempos continuam bem vivas na minha mente. Na altura éramos todos como uma família e cultivávamos valores que hoje em dia não passam de miragens no deserto de egoísmo e futilidades que se transformou a nossa sociedade. Também nesse ano lectivo de 90/91 o campeonato de futebol inter-turmas teve um sucesso retumbante, embora a nossa equipa feminina não tenha participado por falta de jogadoras (as nossas colegas na altura eram muito “finas” e estavam mais viradas para o clube de poesia criado pelo professor Chandinho) e a equipa masculina tenha sido eliminada na fase final. Ficamos em 3º lugar, se bem me recordo e como prova da marca indelével que esses momentos deixaram em mim (acredito que em todos os outros também), fica aqui, como puro exercício de memória, a constituição da nossa equipa na altura: Nelson Bixi-pô na baliza, Diallo e Agnaldo na defesa (os duplex, como lhes chamávamos), Nilton Garido e Adriano na frente, sem falar dos suplentes de luxo: Laureano, Maizí, Ailton, Gilberto e eu. Um verdadeiro “dream team”.

Com a passagem para a 9ª classe, tivemos que abandonar a nossa querida e pacata Trindade para irmos estudar no Liceu Nacional, na cidade Capital. Desse tempo, no ano lectivo de 91/92, lembrei-me primeiro do facto de alguns colegas terem desistido de continuar a estudar por falta de recursos dos seus pais para lhes pagar a deslocação diária à capital, que mesmo nos falecidos autocarros “ Scania”, ainda ficava caro. No que ao desporto escolar diz respeito, naquele ano, houve um campeonato de futebol 5 e de voleibol, mas apenas no sector masculino. Fomos eliminados logo na primeira volta, nas duas modalidades. Como escolhi o Futebol 5, não posso falar do que se passou no voleibol. No futebol 5, mesmo a grandisosidade do liceu não dispersou o entusiasmo dos alunos. A titulo informativo, fiquem a saber que a culpa da nossa derrota foi claramente o facto de não terem utilizado as “estrelas” da Trindade (eu e o Diallo) e também devido ao excesso de individualismo dos nossos melhores jogadores (senhores Braulio, Burindá e Botelho, a culpa foi vossa, “ouviram”?! Lol). No final do jogo, discutimos bastante, já que era ponto assente que tínhamos melhores jogadores que o adversário, ficamos uns dias amuados, mas depois passou. Aprendemos a lição e hoje continuamos grandes amigos. É essa, a última lembrança que tenho do desporto escolar em São Tomé e Príncipe, na sua vertente de competição.

Nesse remoer de memórias que fatalmente me fez visitar outros aspectos da minha adolescência, uma parte de mim desejou que o tempo voltasse atrás e que, para além das experiências inesquecíveis que a prática do desporto escolar me proporcionou, pudesse também reviver outras situações que hoje em dia, os alunos do secundário, infelizmente deixaram de vivenciar: As festas do 1º de Junho que eram comemoradas até à 7ª classe e onde mais importante do que a roupa e sapatos novos, era o convívio entre alunos e professores; Os “esbanjos” que assinalavam com pompa e circunstancia as lições nº 100 de cada disciplina; A inocência dos namoros de adolescente e os beijos roubados na hora de saída da escola; O companheirismo e a entreajuda entre os alunos, sempre presentes nas horas das provas trimestrais e que se estendiam às épocas dos exames, onde os mais aplicados, os que ficavam dispensados, faziam questão de ajudar os colegas com maior dificuldades nas horas de estudo, sem pedir nada em troca; O respeito e a admiração que nutríamos pelos professores e que eles faziam por merecer e por ultimo, os dias de trabalho cívico na escola. Sim, senti saudades dessa invenção socialista introduzida pelo MLSTP no nosso País. Senti saudades dos sábados que íamos capinar, lavar e pintar a nossa escola, a escola que nos ensinaram a amar e cuidar, a construir e a conservar.

Posto isso, creio que não restam dúvidas sobre o papel preponderante que o desporto escolar pode ter na vida dos nossos estudantes e na sua formação cívica. Não falo apenas do benefício que trás à saúde e da possibilidade de poder-se descobrir alguns talentos nessas competições, mas falo sobretudo do impacto que esse tipo de competição pode ter na vida social dos alunos e na formação do seu carácter. Falo do espírito de equipa, de união e de camaradagem que deve ser cultivado desde tenra idade; Falo do convívio e sociabilização que essa actividade promove entre os alunos, num ambiente diferente da sala de aulas e da possibilidade de poderem ocupar os tempos livres com uma actividade saudável e barata em vez de andarem na "má vida"; Falo da possibilidade deles aprenderem a compartilhar sucessos e insucessos e lutar por objectivos e sonhos colectivos e, falo também da necessidade de se incutir nos nossos jovens desportistas os valores do fair play e da competitividade saudável, para que deixem de cultivar pelos seus adversários, sentimentos como ódio, a inveja e “sede de sangue” que de uma forma geral, graça no desporto São-tomense e influencia o comportamento dos praticantes, dirigentes e adeptos. Por tudo isso, saúdo veementemente a ideia do Secretario da juventude e desporto em ressuscitar a pratica do desporto escolar e faço votos que ele consiga levar esse projecto à bom porto( como quem diz: Que haja dinheiro e vontade politica). É claro que me alegraria muito mais se fosse anunciada a reforma geral do nosso sistema de educação, mas isso são contas do outro rosário.