quinta-feira, 23 de julho de 2009

DE IMPROVISO EM IMPROVISO, ENCHEU A GALINHA (STP) O PAPO

Chegaram cheios de ilusões e alguns com elevadas expectativas em relação à participação de STP nos 2ºs Jogos da Lusofonia. A comitiva oficial era composta por 60 elementos, sendo que apenas 30 e poucos eram atletas, incluindo aqueles que tiveram de tratar dos seus passaportes com dinheiro próprio, para não correrem o risco de ficar em terra e os que pagaram a própria passagem, para aproveitar o visto “de graça” que lhes abria uma janela de oportunidade em solo Português. O resto?! O resto era uma mescla de dirigentes de todo tipo, treinadores de todo tipo, medica, jornalistas de todo tipo e alguns amigos sortudos. E ainda dizem que a comitiva foi “encolhida” ao máximo, por falta de financiamento.

Desembarcaram no aeroporto da Portela trajados à rigor: Os basquetebolistas com T-shirts da “F.A.M.A” (Fundação Aurélio Martins) e os restantes atletas com T-shirts do “BISTP”. Estávamos a espera de ver atletas da REPUBLICA DEMOCRATICA DE SÃO TOMÉ E PRINCIPE, ostentando com orgulho as cores da nossa bandeira nas suas vestes – como é da praxe em qualquer delegação oficial que represente qualquer País a nível desportivo – mas ao que parece, por força dos patrocínios improvisados à última hora, alguém resolveu dar um torcicolo no pescoço deste “costume”. E nem se podem desculpar com falta do equipamento Nacional, já que embarcaram em São Tomé vestidos com “ o amarelo e verde” e por indicação superior, foi feita a troca de vestimenta já em pleno voo. Coitados dos voluntários dos Jogos, que tiveram um trabalhão para distinguir os membros da comitiva do BISTP, perdão, da comitiva de STP, na altura do acolhimento no aeroporto.

A nossa “selecção” de Basquetebol foi a primeira a entrar em acção, contra a frágil selecção de Macau. Os nossos rapazes eram mais altos e mais dotados tecnicamente, mas nada puderam fazer contra a velocidade de execução, a experiencia internacional e organização colectiva dos jogadores Asiáticos. Resultado: 102 a 77! Creio que não se podia pedir muito mais a uma “selecção” composta por jovens amantes do “basket”, que se juntam aos fins-de-semana para atirar umas bolas ao cesto numa “quadra” esburacada, desprovidos de quaisquer noções tácticas do jogo e inclusive, denotando algumas lacunas no conhecimento das regras internacionais do basquetebol. Exigia-se pois, algum trabalho de casa nestes dois aspectos, embora tenha ficado com a leve impressão de que o próprio seleccionador Nacional também não percebia lá muito da “coisa”. Enfim, o que se pode fazer, quando não se cria condições no País para termos melhores jogadores, melhores treinadores e melhores dirigentes desportivos?!

No segundo jogo, para atribuição do último e penúltimo lugares, contra a selecção de Moçambique, veio mais uma vez ao de cima as fragilidades tácticas e de organização de jogo, que somando à falta de um treinador qualificado, nos conduziram com certa naturalidade ao último lugar no torneio de Basquetebol dos jogos da Lusofonia 2009.

Duas notas negativas à delegação de Basquetebol, nomeadamente ao presidente da federação:

1ª – Não entendo como é que não se criou as condições necessárias para a convocação do único atleta profissional do País, o meu amigo Eki “poste”, campeão Nacional de Portugal pelo ex-glorioso, S.L.B. Creio que, o que se poupava no bilhete de passagem do mais fraco jogador que veio de São Tomé, dava e sobrava para pagar o seguro e o subsídio diário de alguém que representaria uma mais-valia e voz de comando para a nossa jovem e inexperiente selecção.

2º - Em termos logísticos, é inadmissível que os atletas de uma selecção oficial de um País não tenham ao seu dispor durante um jogo, simples garrafas de água para matarem a sede e tenha sido necessário recorrer de improviso ao stock da claque oficial para suprir essa falha vergonhosa… Como se não bastasse vermos sistematicamente os nossos atletas a serem assistidos pelos massagistas dos adversários nas alturas das lesões, porque não temos condições de ao menos comprar uma mala de primeiros socorros com os artigos básicos de assistência aos desportistas. Até quando vamos continuar assim, meus senhores?

No dia seguinte, entrou em acção a nossa selecção de futsal, a rainha dos improvisos: Tinha um seleccionador improvisado (sempre conheci o Sr. Lima Neto como um treinador de andebol que fazia uns biscates no voleibol, não sabia que o homem também fazia biscates no futsal), tinha 3 ou 4 jogadores seleccionados de improviso em Portugal, porque não havia dinheiro para trazer a equipa completa de São Tomé (e garanto-vos que nem eram dos melhores que temos por cá) e tinha também, um massagista recrutado de improviso no dia da cerimónia de abertura e que nem estava devidamente credenciado para se sentar no banco de suplentes nos dias dos jogos (mas, ainda bem que o recrutaram, já que era o único que incentivava e dava indicações aos nossos jogadores, inclusive nas alturas em que a equipa adversaria pedia um desconto de tempo e o nosso seleccionador mantinha-se impávido e calado, a espera da intervenção divina). Juntando tudo isso às deficiências técnicas acima referidas quando falei do Basquetebol, nomeadamente, a nível da organização táctica, da falta de um sistema de jogo, do desconhecimento de algumas regras do jogo e da ausência de uma liderança qualificada e competente, foi também com naturalidade que sofremos goleadas em todos os jogos e chegamos ao fim do torneio de futsal em último lugar (com algum mérito, diga-se de passagem), sendo que, apenas no jogo contra o Brasil, a qualidade e a garra de alguns dos nossos jogadores vieram ao de cima. Enfim, o que se pode fazer, quando não se cria condições no País para termos melhores jogadores, melhores treinadores e melhores dirigentes?!

Um exemplo da falta de competência do corpo técnico da nossa selecção: No final dos jogos, os atletas dos outros Países permaneciam no campo a fazerem alongamentos e exercícios de relaxamento muscular durante uns 15 minutos (como ditam os livros, nos casos em que as equipas têm jogos em dias seguidos) enquanto os nossos dirigiam-se logo aos balneários. O mais curioso é que nem foram capazes de seguir o exemplo dos outros nos jogos seguintes. Bom, ao menos podemos nos gabar de termos sido a única selecção dos PALOPS a apresentar um seleccionador “da casa”. Incompetente ou não, era dos nossos.

Falta apenas referir que também no futsal, foram os massagistas das equipas adversárias a assistir os nossos atletas nas alturas das lesões, já que no meio de tantos improvisos, esqueceram-se de improvisar uma mala de primeiros socorros para o nosso massagista improvisado.

Não pude assistir à prestação dos nossos atletas do voleibol de praia, mas quando soube que fomos eliminados pela dupla de Timor, lembrei-me logo das palavras do responsável da equipa no aeroporto, quando tentei aferir as expectativas que traziam os nossos voleibolistas: “viemos só para marcar presença”, disse-me ele, em jeito de premonição. Enfim, o que se pode fazer, quando não se cria condições no País para termos melhores jogadores, melhores treinadores e melhores dirigentes?!

A nossa “honra” foi salva pelos praticantes de Atletismo de pista e de Taekwondo.
É curioso notar que todas as atletas medalhadas no atletismo, residem e treinam actualmente em Portugal, onde as condições de treino, embora não sejam ainda as ideais, são de longe, melhores das que dispunham em STP, o que me leva a questionar se os resultados seriam os mesmos, se elas ainda estivessem a fazer umas corridas na velha e esburacada pista de atletismo do Estádio 12 de Julho (será que chegaram a incluir uma pista nova depois das obras de remodelação?). Em conversa que mantive com algumas delas, garantiram-me que não. Esqueci-me foi de perguntar, se elas usufruem de algum tipo de apoio financeiro por parte do Estado São-tomense, como atletas internacionais que são.

Quanto ao Taekwondo, confesso que não tinha noção do nível de excelência em que se encontram os nossos atletas e nem faço a mais pálida ideia das condições de treino que dispõem (será que são todos “made in Palácio dos Pioneiros”? quem os treina?). O facto incontornável é que dos 6 atletas que nos representaram nesta modalidade, 5 ganharam medalhas, incluindo uma de ouro e uma de prata. Fantástico!!!!

Uma palavra de apreço para o nosso “medalha de ouro”, Eloy Boa Morte, um diamante em bruto (segundo dizem os especialistas) que poderia elevar bem alto o nome de São Tomé e Príncipe, até a nível olímpico (Estava inclusivamente qualificado para os jogos Olímpicos de Pequim e não pôde participar pelo mesmo motivo de sempre: Falta de verba!). O Eloy é atleta do S.L e Benfica, clube pelo qual farta-se de ganhar títulos, sem qualquer tipo de apoio, vendo-se obrigado a fazer uns biscates para sobreviver, o que já o levou a equacionar o abandono do Taekwondo, caso as coisas não mudem num futuro próximo. Não sou bruxo, mas não me admiraria mesmo nada, se num futuro próximo visse o “nosso” Eloy a triunfar com as cores de um outro País qualquer, que não perderá a oportunidade de ter um atleta deste calibre nos seus quadros (lembram-se da ex-nossa, Enezenaide Gomes, hoje Naide Gomes?). Abram as pestanas, senhores dirigentes desportivos!

A prestação de STP em Atletismo e Taekwondo, veio mais uma vez provar que a nível individual, temos alguns talentos a ter em conta, mesmo nas modalidades colectivas. O complicado tem sido proporcionar-lhes condições de treino e de trabalho para explorarem ao máximo o seu potencial e a nível das modalidades colectivas, acrescente-se também, o vazio que há na formação (ou contratação) de treinadores que sejam capazes de realizar um trabalho serio e competente, de forma a faze-los funcionar em equipa. Para isso, era também necessário que a competência e a visão estratégica fizessem escola a nível dos nossos dirigentes desportivos e não só. Mas depois teríamos que resolver o eterno problema da falta de meios para tudo, o que nos faria voltar ao ponto de partida. Complicado, não é?

Apesar de todos esses improvisos e das dificuldades do costume, conseguimos conquistar 7 medalhas e ficar no quinto lugar da classificação geral, a frente de Países como Cabo Verde, Moçambique e Guiné-Bissau. Um feito estrondoso, dada a falta de expressão internacional dos nossos atletas e às dimensões reduzidas, do nosso País e da nossa população.

Imaginem agora, meus senhores, como seria se tivéssemos investido algum dinheiro no desporto Nacional? Se tivéssemos construído algumas infra-estruturas básicas, como um pavilhão multi-desportivo e um campo de futebol 11 em cada distrito? Se tivéssemos construído pelo menos duas pistas de atletismo dignas nos distritos mais populosos, ou talvez uma em São Tomé e outra no Príncipe? Não teriam que ser monumentos impotentes e grandiosos, bastava que fossem funcionais. Como seria se tivéssemos apostado mais na formação e qualificação dos nossos treinadores? Como seria se tivéssemos promovido e apoiado o desporto escolar e as diferentes competições Nacionais, pelo menos nas modalidades com maior expressão?

Num País em que tudo falta e tudo é prioritário, pretender que se invista seriamente no desporto, pode até parecer utópico, mas creio que mais uma vez ficou provado que o retorno seria incomensurável.

Uma nota final para o facto insólito dos repórteres da TVS destacados para cobrir a participação de STP nos jogos da Lusofonia, terem embarcado sem nenhuma câmara de filmar, dado que a ultima hora, “descobriu-se” que a televisão publica apenas dispunha de uma câmara de filmagem operacional e naturalmente que não podiam privar-se dela por cerca de quinze dias. Mas como as passagens já estavam pagas e os vistos garantidos, porque não vir passar quinze dias de ferias “forçadas” à Portugal? Foi pena eles não terem tido algum “jogo de cintura” para improvisar uma câmara de filmar e poder assim, imortalizar o momento histórico em que o (ainda) nosso Eloy Boa Morte, subiu ao mais alto lugar do pódio para receber uma medalha de ouro, ao som do “Independência total”.