domingo, 20 de junho de 2010

CAMPANHA ELEITORAL OU GUERRA CIVIL?!

Há algumas semanas atrás, o Comandante da Policia Nacional de STP, afirmou, aquando da entrega de novas armas ao comando nacional, que a polícia encontrava-se agora melhor preparada para enfrentar de forma implacável o período conturbado das eleições que se avizinham. Esta semana, foi o Comandante do exército a fazer declaração semelhante, pedindo uma maior neutralidade dos “tropas” no processo eleitoral e redobrada atenção, para o caso de serem chamados a intervir. Juntando à isso, o “clima” pesado de rivalidades exacerbadas que já se sente no ar em vários pontos do País e as declarações incendiarias de alguns dirigentes políticos, que vêm por em causa a legalidade e a justeza do processo eleitoral, antes mesmo dele acontecer, lançando o mais lenha para a fogueira, duas questões pertinentes ganham relevo: Será que conseguimos desvirtuar de tal forma o real papel das campanhas eleitorais no nosso processo democrático, ao ponto de ser necessário colocar a polícia nacional e o exército em alerta máximo?! Afinal, estamos a nos preparar para uma campanha eleitoral ou para uma guerra civil?!

É claro que gostaria de acreditar que os comandantes das forças militares e de segurança pública estão a exagerar nas precauções ou que andam um pouco desenquadrados da nossa realidade, assim como todos os outros, que a nível público ou privado têm manifestado essa mesma preocupação, mas, a realidade, a sempre dura realidade, começa a mostrar-nos que o Pachire e o Vicente podem afinal, ter grande razão.

Infelizmente, já há algum tempo que é prática comum em São Tomé e Príncipe confundir-se “adversários políticos” com “ inimigos de morte” e numa sociedade tão pequena e politizada como a nossa, a falta de discernimento na compreensão desses dois conceitos tão diferentes, tem contribuído de forma decisiva para a deteorização da nossa jovem democracia e para o extremar das relações entre os membros da nossa classe política, o que fatalmente condiciona o comportamento dos militantes e simpatizantes dos vários partidos políticos, com consequências graves, a nível social e não só. Esse clima de frequente tensão nas alturas das eleições é o expoente máximo desse paradigma.

Infelizmente, os São-tomenses ainda não compreenderam que em democracia, as pessoas têm a liberdade para escolher e apoiar os candidatos e os partidos que bem entenderem, pelos motivos que bem lhes apetecer. Em democracia, assim como na vida, é natural as pessoas alimentarem convicções e ideais diferentes e é muito normal, as pessoas defenderem teses e projectos diferentes, ou até, defenderem de forma diferente, as mesmas ideias e os mesmos projectos, sem que para isso, tenhamos que ser inimigos de morte, sem que para isso, tenhamos que ser incivilizados e violentos na afirmação do nosso ponto de vista, porque em última análise, pelo menos em teoria, há um objectivo comum que devia nos unir nesse mar de diferenças pseudo-ideológicas.

Infelizmente, os São-tomenses ainda não se deram conta que a politica, além de ser um “mal” necessário, pode em certa medida, ser uma coisa bonita e proveitosa, onde até a demagogia e o populismo, em doses comedidas, constituem-se como ingredientes acutilantes do próprio processo; Onde o diálogo e a tolerância devem ser as ferramentas mais importantes para se construir consensos e desbravar as diferenças, e onde a violência, o jogo sujo e a selvajaria não podem em hipóteses algumas, ser promovidas, ou sequer, toleradas.

Infelizmente, os São-tomenses ainda não perceberam que, num País com as particularidades do nosso, onde todos somos conhecidos, amigos ou familiares de todos, onde grande parte do eleitorado tem a hipótese de estar frente-a-frente com os candidatos dos seus distritos, em reuniões e manifestações políticas, na época da campanha eleitoral e expor os seus anseios, falar dos seus problemas, ou até, passar-lhes reprimendas e gritar “quidalé”, a nossa democracia podia e devia ter contornos menos problemáticos e mais profícuos, o que por si só, tornaria a nossa politica mais bonita e estimulante.

Infelizmente, os São-tomenses ainda não se aperceberam que as eleições não são uma questão de vida ou morte e que as vitorias e derrotas, e a própria alternância do poder, são traços estruturantes de uma democracia saudável. Não há pois, que tentar vencer a qualquer preço, ludibriando batoteiramente os adversários e viciando as regras do jogo. Não há pois, que promover desentendimentos inúteis e rivalidades extremas entre “irmãos”, abrindo feridas profundas que demoram a sarar, nos casos em que saram.

O que ganham, afinal, os nossos políticos quando no alto dos seus palanques, limitam-se a apelidar todos os seus adversários de ladrões e corruptos, de forma leviana, quase sempre sem provas concretas, atiçando e inflamando o ódio popular contra a própria classe?! O que ganham os nossos políticos quando patrocinam os habituais panfletos anónimos que são largados na calada da noite, quase sempre com informações falsas, caluniando de forma irresponsável os seus adversários e manchando de forma indelével a sua reputação?! O que ganham, afinal, os nossos partidos políticos quando induzem ou mandam os seus militantes rasgarem cartazes de propaganda dos seus adversários?! O que ganham os nossos partidos quando instruem os seus militantes a invadirem e acabarem com reuniões dos seus adversários nas suas zonas de residência?! Ou até quando lhes pedem para nem sequer admitirem que os adversários “entrem” nas suas “zonas”para fazer campanha, chegando mesmo ao ponto de correrem com eles à pedrada?! - Esquecem-se que há pessoas maldosas que se aproveitam dessas situações para acordarem ódios antigos ou resolverem de forma menos ortodoxa, desentendimentos mal explicados no passado, criando uma espiral de violência que depois, sob o signo da retaliação, acaba por gerar mais violência ainda. Por fim, o que ganham os nossos políticos ao lançarem constantemente suspeitas de fraude sobre os nossos escrutínios eleitorais, demonstrando um desrespeito arrogante pela vontade soberana do povo e descredibilizando um processo, no qual, eles próprios são parte activa?!

Felizmente, tal como na nossa bisca 61, baralhamos e voltamos a dar as cartas, sempre que descobrimos que o jogo está “remado”, acredito que ainda vamos a tempo de dar a volta por cima e fazer desaparecer o espectro da “eminente convulsão social” sempre presente na s alturas da campanhas eleitorais em São Tomé e Príncipe. Precisamos apenas que haja vontade política, coragem para assumir a ruptura definitiva com o passado, sem estar a espera que os outros o façam primeiro e bons exemplos que venham de cima, porque como dizia o outro:”Dar o exemplo não é a melhor forma de influenciar os outros, é a única!”. Porque em ultima analise, independentemente da difícil situação económica e social do País e dos problemas gravíssimos que ainda temos para serem resolvidos, esse tipo de tensão popular na altura das eleições, esse ódio visceral dos eleitores contra os políticos e partidos que não são da sua escolha, são causados e incentivados pelos próprios políticos, que se aproveitam de qualquer situação de insatisfação popular para em primeira instancia, tirar dividendos políticos, “queimar” os adversários e só depois, em raras situações, dar um contributo positivo para a resolução desses problemas.

Custa assim tanto encontrarmos uma nova forma, mais positiva e frutuosa de pensar a nossa politica e o nosso País?! Custa assim tanto enterrarmos o machado de guerra e aprendermos a aceitar e respeitar as opções de cada um, dentro da diferença e diversidade politica que hoje caracteriza a nossa sociedade?! Custa assim tanto debatermos e divergirmos nas nossas ideias e convicções, sem criar rancores e inimizades?!

E aos políticos em particular, custa assim tanto aproveitar o período de campanha eleitoral para apresentar projectos, debater ideias e apontar um rumo ao País, em vez de se perderem nos ataques pessoais e conversas de beira de estrada, desprovidas de qualquer substância útil?!

Custa assim tanto instruir os militantes para que abandonem o habitual espírito tendencialmente belicista e encarem esse processo com serenidade, calma, tolerância e o necessário respeito pelos adversários?!

Custa assim tanto, transformar esse período de campanha eleitoral num “leguelá” colectivo, animado e colorido, aproveitando até a possibilidade de se comer, beber, dançar e assistir a concertos de graça?!

Custa assim tanto, em caso de derrota, aceitar “à primeira” os resultados das eleições e felicitar os vencedores, como aconselham os bons costumes democráticos e não estar constantemente a incendiar as hostes dos militantes com acusações de fraude e batota?!

Talvez até custe ou talvez a coisa já nem tenha remédio… E eu aqui armado em optimista. Que ingenuidade a minha!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

AFINAL, O MUNDIAL É MESMO EM ÁFRICA!

Depois de 18 edições, 80 anos de existência e depois de se ter realizado 10 vezes na Europa, 4 vezes na América do sul, 3 vezes na América do norte e 1 vez na Ásia, o segundo maior evento desportivo do mundo acontece esse ano em África. Depois de séculos de sofrimento e privações, de décadas de luta árdua pela conquista de direitos básicos que outros povos têm como garantidos há muito tempo, uma das maiores conquistas dos tempos modernos e um dos sonhos colectivos mais entusiasmantes dos africanos, desde a conquista das independências dos nossos países, começou a materializar-se no passado dia 11: O campeonato do mundo de futebol chegou finalmente à África, à nossa África. Apesar de ser a África do sul o país a ter o privilégio e o mérito de sediar o mundial de futebol, creio não estar a exagerar ao afirmar que, pela primeira vez na história, um continente inteiro sente e vive o mundial como seu. Este é pois, o mundial de todos nós, africanos!

Os outros membros da FIFA, os não africanos, quiçá imbuídos ainda num espírito neo-colonialista, desde sempre torceram o nariz a essa conquista. Os jornalistas ocidentais, quais profetas da desgraça, criticaram logo a decisão da FIFA e traçaram os piores cenários de insucesso, exaltando sempre os atrasos nas obras, as convulsões sociais, as dificuldades de segurança e tudo mais que podiam agarrar para tentar convencer o mundo que tinha sido um erro atribuir-se à um pais africano a responsabilidade de organizar tamanho evento. Disseram aos seus conterrâneos para não viajarem para a África do sul; alertaram-nos de forma doentia para os inúmeros perigos que estariam a sua espera; criaram gabinetes de crise para emitirem documentos em tempo recorde, prevendo que seriam todos assaltados assim que pisassem o solo sul-africano e em alguns casos, destacaram os seus próprios seguranças para proteger os seus cidadãos e atletas, já que não depositam confiança mínima nas forças policiais lá do gueto. Ainda hoje, já com o campeonato a decorrer, cada assalto que acontece, cada falha logística que se verifica, cada doente de com sida que morre, cada sem-abrigo que se encontra, cada desempregado que se descobre é logo noticia de abertura de telejornal e manchete de jornal, para mostrarem ao resto do mundo que afinal tinham razão, que os selvagens, analfabetos, corruptos e polígamos africanos não podiam nunca ter o direito de realizar um evento de escala planetária, como se esses fossem problemas exclusivos da África do sul, como se não houvesse também desemprego na Europa, como se não houvesse também crime nas Américas ou como se não se morresse também de fome e de sida na Ásia. Seria bonito se assim não fosse, mas infelizmente, essas chagas sociais são, também elas, de escala planetária.

Afinal, por obra e graça de Deus, os estádios ficaram prontos, os aeroportos, os hotéis, as estradas, a segurança e toda a logística acessória também está a funcionar dentro dos parâmetros razoáveis e o primeiro mundial em solo africano está a acontecer. Tem havido algumas falhas de organização?! Sim! Tem acontecido algumas situações complicadas a nível de segurança?! Sim! Mas se até hoje ninguém conseguiu organizar um mundial perfeito, por que carga de água se exige isso da África do sul?!

A cerimónia de abertura foi bonita, majestosa e imponente, digna de um mundial de futebol e das melhores cerimónias de abertura que pude assistir até hoje (a melhor, para mim, foi a dos jogos olímpicos de Pequim em 2008) e não pude deixar de emocionar-me quando o Jacob Zuma declarou oficialmente o inicio do mundial, de mãos dadas com o Joseph Blatter, esse irresponsável e teimoso presidente de FIFA, que a par do próprio presidente da África do sul e do Mandela, foi um dos grandes obreiros dessa conquista que enche de orgulho todos os africanos. Disseram que o homem era louco por acreditar na competência e dedicação dos africanos; disseram que a decisão de levar o mundial à África escondia uma agenda política secreta, quiçá uma rede de corrupção e jogos de interesse e até definiram vários países suplentes que estariam de prontidão para receber o mundial em ultima hora, já que era garantido o fracasso dos africanos, mas no fim, e como sempre acontece, o sonho comandou a vida e o nosso mundial africano é hoje uma realidade.

Que continue a correr tudo dentro da normalidade e que as selecções africanas, empolgadas pelo som estridente das vuvuzelas, consigam superar-se e surpreender o mundo desportivo, apoiadas nas estatísticas favoráveis, que mostram que apenas por uma vez, o mundial não foi ganho por uma selecção do mesmo continente do País organizador. Teremos nós, direito à essa cereja no topo do bolo?! Quem viver, verá!