quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

DEMITA-SE, SENHOR PRESIDENTE! - Parte II

“O homem que está muito ocupado em censurar os outros está sempre pouco ocupado em examinar a si próprio.”
(Thomas Lye)


Ouvi e li as polémicas declarações do senhor Fradique de Menezes, em resposta a todos aqueles que se manifestaram contra a sua intenção de exercer em simultâneo a presidência do MDFM e a presidência da Republica e confesso que fiquei semi-abestalhado. A minha abestalhação só não foi total, porque em resultado da dupla função que o senhor Fradique agora exerce, fiquei sem saber se foi o presidente da Republica ou o presidente do MDFM, quem debitou tamanhos impropérios aos microfones da rádio Nacional. Se foi o presidente do MDFM, ressalvando a parte da linguagem “baixa”, das ameaças e dos insultos que nunca ficam bem em qualquer circunstância, nada tenho a dizer, mas se foi o presidente da Republica, o caso começa a ganhar contornos preocupantes: Um presidente da Republica não deve em circunstância alguma, ter esse tipo de discurso incendiário e beligerante; Um presidente da Republica não deve ameaçar por em causa a paz e estabilidade política no País quando a essência da sua função (segundo a tal constituição que devia ser respeitada) é garantir a independência nacional, a unidade do Estado e assegurar o regular funcionamento das instituições; Um presidente da Republica, em democracia, assim como os restantes órgãos do poder político, tem que saber conviver com a crítica e a pluralidade de opiniões, já que uma sociedade civil interventiva é um dos pilares sagrados da democracia participativa; Um presidente da Republica não deve definir como “escumalha” todos aqueles que têm opiniões contrárias às suas, e que, resguardados no inalienável direito à liberdade de expressão (consagrado também na tal constituição), as exprimem de forma responsável e fundamentada; Um presidente da Republica, mesmo que eleito com 60% dos votos, não tem carta-branca para cometer todos os desmandos que lhe der na telha, porque num estado de direito, há uma lei fundamental que consagra expressamente as suas competências e estabelece os limites das suas funções. À essa lei fundamental, deu-se o nome de “constituição da Republica” e para o seu defensor oficial, foi nomeado precisamente o presidente da Republica. Ironia do destino.

Ao contrário do que disse o senhor Fradique de Menezes, não me acho (nem tenho tal pretensão) o centro da sabedoria mundial (creio que esse sentimento é extensível aos restantes membros do “são tome yahoo group”), mas tenho as minhas convicções e defendo-as fundamentadamente até que me provem que estou errado. Neste caso estou convicto que, à luz da nossa constituição, o senhor Fradique de Menezes não pode exercer simultaneamente os cargos de presidente de todos os São-tomenses e de presidente dos militantes do MDFM e se alguém conseguir provar que estou errado, não terei vergonha nenhuma em retroceder na minha posição, porque não tenho vergonha de raciocinar e aprender. Sobre esse assunto, o senhor Fradique de Menezes deu ênfase à uma opinião emitida na RDPÁfrica por um constitucionalista Português em 2007 que lhe foi favorável (esquecendo-se que tal observação teve por base o facto dele deter na altura “apenas”o cargo presidente honorário, embora pessoalmente acho que vem a dar no mesmo) e já que ele tem preferência pelas opiniões dos constitucionalistas estrangeiros, espero que também tenha ouvido o parecer do Dr. Bacelar Gouveia dado ontem aos microfones da mesma RDPÁfrica (ainda bem que temos a RDPÁfrica para nos prestar esse tipo de serviço publico, já que os nossos jornalistas nem se deram ao trabalho de ir ouvir alguns dos juristas conceituados que pululam na nossa praça e que certamente acrescentariam mais valias ao debate).

Posto isso, mantenho e reforço a minha posição de que o senhor Fradique de Menezes devia se demitir de um dos cargos que actualmente ocupa de forma a ser reposta a legalidade e já que, exceptuando o MDFM, todos os partidos com assento no parlamento estão em consonância na condenação dessa situação, espero que a nível da Assembleia Nacional, se desencadeie o processo de averiguação da constitucionalidade desse acto presidencial, solicitando ao Supremo Tribunal de Justiça (que também tem funções de Tribunal Constitucional) que se pronuncie em sede de fiscalização sucessiva concreta da constitucionalidade.

domingo, 20 de dezembro de 2009

DEMITA-SE, SENHOR PRESIDENTE!!!!

Constituição da Republica democrática de São Tomé e Príncipe:

Artigo 19.º
Restrição e Suspensão
1. O exercício dos direitos fundamentais só pode ser restringido nos casos previstos na Constituição e suspenso na vigência de estado de sítio ou de estado de emergência declarados nos termos da Constituição e da lei.

Artigo 63.º
Organizações políticas
1. Todo o cidadão pode constituir ou participar em organizações políticas reconhecidas por lei que enquadram a participação livre e plural dos cidadãos na vida política.

Artigo 72.º
Incompatibilidade
1. As funções de Presidente da República são incompatíveis com qualquer outra função pública ou privada.

Incompatível – O que não é compatível; O que envolve contradição; Inconciliável; O que não pode ser acumulado com outro.

Artigo 80.º
Competência própria
Compete ao Presidente da República:
a) Defender a Constituição da República.

Defender – Tomar a defesa de; Proteger; Resguardar.


“ Há coisas tão claras e distintas, que na sua essência, não contêm mais nada além do claro e do distinto”.

Esta frase era recorrentemente usada pelo meu professor de filosofia no 11º ano sempre que quisesse demonstrar que, num mundo de conceitos e valores relativos, onde a ambiguidade e a múltipla interpretação imperam, há alguns valores e conceitos que são absolutos e não deixam margens para qualquer tipo de malabarismo interpretativo. Lembrei-me mais uma vez desta frase quando soube que o Senhor Presidente da Republica Democrática de São Tomé e Príncipe, Fradique de Menezes, tinha sido eleito presidente do partido politico MDFM, e mais, marimbando-se completamente para os preceitos constitucionais que definem o nosso País como um estado de direito, garantiu que ia exercer os dois cargos em simultâneo, posicionando-se naturalmente como cabeça de lista do seu partido nas eleições legislativas de Abril próximo, e também que, iria cumprir o seu mandato de Presidente até ao fim. Ou seja, disse que apenas estaria disposto a assumir o seu lugar de deputado quando acabasse o seu mandato presidencial. Já agora, pergunto: E se o seu partido vencer as eleições? Vai “emprestar” o cargo de primeiro-ministro a um pau mandado qualquer até Setembro de 2011 ou largará de imediato o “osso Presidencial” para atacar o outro “osso” mais apetecido?! Atenção à coerência, senhor Presidente!

Naturalmente que esse desfilar de atropelos na nossa lei fundamental causaram-me a mais profunda indignação e como nessas coisas do “claro e distinto”, convém sempre ter à mão os argumentos necessários para sustentar as nossas afirmações, recorri aos articulados da nossa constituição acima elencados para justificar o título do meu texto e simultaneamente, a titulo de curiosidade, perguntar aos senhores juízes do Supremo Tribunal de Justiça de STP (que nas horas vagas, é também o Tribunal Constitucional), qual a interpretação que fazem do artigo 72 da nossa constituição, já que o nosso Presidente afirmou publicamente que conhece o artigo, mas segundo as cabeças pensantes que o aconselham, é vago e sujeito a varias interpretações. E esta, hein?!

Se é verdade que o artigo 63 da nossa constituição, enquadrado na parte dos direitos fundamentais dos cidadãos, concede a todos o direito de constituir ou participar em organizações politicas, o artigo 19 (e não é “a toa” que o precede), determina claramente que a própria constituição pode restringir alguns desses direitos fundamentais. É precisamente o que faz o artigo 72, que, trocado por miúdos, determina que o Presidente da república, enquanto estiver no exercício das suas funções, apenas pode ser Presidente da república e nada mais.

Que o senhor Fradique de Menezes seja eleito presidente do MDFM e tenha a pretensão de vir a ser o Primeiro-ministro de São Tomé e Príncipe, tudo bem! Já que no fundo, trata-se apenas da formalização de uma posição que desde sempre lhe pertenceu e que tinha sido descaradamente camuflada até agora, atrás de títulos como o de “mentor”, “líder espiritual”, “financiador” ou “presidente honorário” do referido partido. Agora, que o faça ostentando ainda (e pretendendo manter) o estatuto de mais alto magistrado da nação, desrespeitando de forma desavergonhada a constituição que por varias vezes jurou defender, é que já extrapola os limites do bom senso, da ética politica e da própria legalidade. Espero ansiosamente as reacções dos outros órgãos de soberania sobre esse assunto, principalmente as do Presidente do STJ, para aferir de uma vez por todas se somos uma república das bananas ou não. Porque se é grave o Presidente violar a constituição, mais grave será se o poder judicial assinar por baixo.

Posto isso, penso que em condições normais (e num País normal), não restaria outra solução ao nosso Presidente, senão demitir-se (ou ser obrigado a isso) das suas actuais funções e assumir na plenitude o risco e a responsabilidade da sua opção pela Presidência do MDFM, até porque, como sabemos, não lhe agrada muito o papel decorativo que a actual constituição impõe ao Presidente da Republica.

Aproveite então essa oportunidade, caro Presidente! Mas sem batotice e sem desrespeitar a nossa lei fundamental. Assuma de uma vez por todas a sua vontade (legitima) em ser primeiro-ministro e avance para a luta, mas não o faça “colado” à cadeira Presidencial, porque além de ser inconstitucional, as “más-línguas” poderão interpretar isso como uma tentativa de manter o “tacho” seguro por mais algum tempo, caso as coisas nas legislativas não corram a preceito.