sexta-feira, 13 de agosto de 2010

OS LONGOS TENTACULOS DO "BANHO".

Nota de introdução: “Banho” é o termo popular que em São Tomé e Príncipe designa o fenómeno de compra de consciência, ou compra de votos por parte de agentes dos partidos políticos, que tem sido prática comum e reiterada nos diversos processos eleitorais desde os meados da década de noventa. O “banho” pode ser dado em dinheiro “vivo”, em serviços ou em géneros.


A memória colectiva situa o aparecimento do fenómeno “banho” nas eleições legislativas antecipadas de 1994, ainda em pequena escala e praticado apenas por um partido político, a quem se atribui a paternidade da coisa (não menciono aqui o nome do partido porque apesar de todos saberem da sua existência, o “banho” é algo que ainda não foi cientificamente provado e nem juridicamente punido, logo, posso ser acusado de estar a prestar falso testemunho). Nas eleições presidenciais de 1996 o fenómeno já foi mais visível e acredita-se que teve um peso assinalável no resultado final das mesmas, tendo atingindo o seu “boom” nas eleições legislativas de 1998, quando todos os grandes partidos enveredaram definitivamente por essa prática. De lá para cá, foi sempre a subir e hoje, perto de atingir a maioridade, pode-se afirmar com toda propriedade (mesmo sem as tais provas cientificas) que o “banho” está entranhado no ADN dos processos eleitorais em São Tomé e Príncipe (incluindo as eleições para os órgãos internos dos partidos políticos e votações na Assembleia Nacional) e que, tirando os pequenos partidos políticos que não dispõem de liquidez financeira, todos os outros o praticam, em maior ou em menor escala, com mais ou menos meios, dependendo dos recursos que conseguem “mobilizar” junto dos parceiros estratégicos no estrangeiro (até para as batotices, somos dependentes da “boa fé” da comunidade internacional, pois nenhum partido politico em STP tem outra fonte de financiamento, já que o pagamento de cotas é quase inexistente e a subvenção do estado é o que se sabe).

Quanto à intensidade e qualidade, o “banho” varia consoante as possibilidades e interesses dos partidos e características do eleitorado. Há quem apenas pode apostar no tradicional “banho” de caneca, que muitas vezes nem dá para lavar os cabelos como deve ser; Há quem se dá ao luxo de dar “banho” de chuveiro, com água quente nas noites frias de gravana; Há quem, em momentos de desespero, invista no “banho” de piscina, com espreguiçadeiras a preceito para trabalhar o bronze, e por fim, há os que tomam “banho” de jacuzzi, com direito ao caviar, champagne e umas mãos finas e suaves a esfregarem…as costas. Normalmente, o “banho” de jacuzzi está apenas reservado aos membros do topo da cadeia alimentar, ou seja, aos altos dirigentes dos partidos que aproveitam para se lambuzarem no mel que jorra em abundância nessas alturas, desviando para uso pessoal, recursos (financeiros e não só) destinados aos seus militantes e também, às contratações sonantes (peixe gordo) que são feitas aos partidos adversários ou à sociedade civil. Talvez seja essa a verdadeira razão da propagação dessa chaga social, pois duvido que o “banho” subsistisse tanto tempo e tomasse a proporção que tem, se o único beneficiário fosse o povo pequeno.

Quanto à sua forma e alcance, a evolução do “banho” tem sido espantosa a todos os níveis: Antigamente eram os partidos que tomavam a iniciativa e procuravam os eleitores para os persuadir, e com pequenas quantidades de dinheiro e alguns brindes de campanha fazia-se uma festança e garantia-se a fidelização de um número considerável de eleitores, que por medo, ou por peso na consciência, normalmente acabavam por votar naqueles que lhes soltavam algum “ferro”. Actualmente, são os eleitores que tomaram o gosto à coisa e procuram os políticos, em vez de serem procurados por eles, as vezes até de forma anormalmente organizada, com listas pormenorizadas de supostos seguidores, com projectos fantasmas bem delineados(pessoais ou colectivos) em busca de financiamentos, com falsos atestados de óbito, pedindo apoio para enterrar a familia toda, com supostas informações valiosas sobre os adversários e até, com uma estratégia de acção a ser implementada nas zonas de residência durante o período de campanha, ameaçando “virar” para os outros partidos caso não sejam atendidas às suas “reivindicações”ou, recusando-se a votar sem antes garantir o seu quinhão, que ao sabor da inflação, atinge hoje valores astronómicos para a realidade São-tomense (lembro-me com algum saudosismo, do tempo em que 20.000 dobras e umas quantas cervejas nacionais “cano alto” era considerado um “banho” de chuveiro. Nos dias de hoje, isso nem dá para lavar o pó de gravana dos pés). Ou seja, antigamente eram os partidos que ofereciam, hoje, de certa forma, é o povo que exige, sabendo que é a única forma de “safar” a sua tese e ver realizados alguns projectos sociais nas suas áreas de residência (chafarizes, lavandarias públicas, geradores eléctricos, televisores, equipamentos de som para grupos de Bulauê, parabólicas, casas sociais e.t.c). Além disso, actualmente, o alcance do “banho” já não é tão linear e apenas uma pequena percentagem do eleitorado ainda vota em função das benesses que recebeu de um determinado partido, ou seja, o povo “abriu o olho” e percebeu que o voto é realmente secreto e que pode votar da forma que lhe apetecer e dar-se ao luxo de “comer” o dinheiro de vários candidatos ou partidos, sem dó e nem piedade, camuflado em falsas juras de fidelidade, pratica que é cada vez mais comum no eleitor São-tomense. De certa forma, pode-se concluir que, no que ao "banho" diz respeito, antigamente eram os políticos que enganavam o povo, agora é o povo que os engana.

Quanto à sua extensão temporal, existe o “banho” pré-eleitoral, que acontece nos meses anteriores a qualquer acto eleitoral; O “banho” eleitoral, que acontece durante o período das campanha eleitorais e por fim, o “banho” de boca de urna, que se desenrola na calada da noite, na véspera do dia das eleições e no próprio dia do voto. O “banho” pré-eleitoral normalmente é de âmbito colectivo, consiste no levantamento das necessidades das comunidades e na resolução de alguns problemas urgentes que podem levar algum tempo a se concretizar (chafariz, lavandaria, gerador, pequenas estradas, e.t.c. O que sob certo prisma, até nem é mau de todo) no patrocínio de festas de freguesia e as vezes, na contratação de influentes personalidades para defenderem as cores do partido no período eleitoral. O “banho” eleitoral é mais imediatista, consiste na entrega de materiais de instalação e utilização rápida (Televisores, parabólicas, chapas de zinco, bicicletas, motos, telemóveis), no patrocínio de festas e piqueniques, na oferta de saldos para telemóveis e senhas de combustíveis, na compra de cartões de eleitores supostamente de outros partidos, para subtrair alguns votos aos adversários e na entrega de algum dinheiro em determinadas situações. Por fim, temos o “banho” de boca de urna, que é um regabofe total, em termos de uangamento de dinheiro e consiste na entrega de determinados valores, directamente aos eleitores, na madrugada do dia de reflexão, em pequenas reuniões pré-programadas em quintais privados e no próprio dia das eleições, junto às assembleias de voto. Não é pois de estranhar que nas vésperas das eleições, as pessoas fiquem acordadas até a madrugada, a espera da visita do “pai natal” ou a existência de grupos de pessoas junto das mesas de voto, que exibem orgulhosamente os dedos ainda não machados pela tinta indelével, adiando até a última, a ida às urnas, esperançados em avistar nos arredores, alguém carregando um saco ou mochila, ou mesmo, carros misteriosos que estacionam discretamente nas traseiras dos locais de voto e mandam espalhar a notícia da sua presença. Tudo isso com o beneplácito dos membros da mesa, dos observadores internacionais e dos agentes da lei. Creio que, de todas as formas de “banho”, o de boca de urna é a pratica mais condenável e que é urgente e imperioso encontrar-se forma de a combater. Só para terem uma ideia da barbaridade da coisa, nas eleições do dia 1 de Agosto, ouviu-se falar em valores a rondar as quinhentas mil dobras por pessoa nos distritos de Mézochi e Água Grande, e em Cantagalo, houve quem oferecesse 50 dólares e 3 chapas de zinco a cada eleitor no dia das eleições. Mesmo descontando o tradicional “aumentar” dos São-tomenses, dá para ter uma ideia da proporção que a coisa já tomou.

No final, aparecem os dirigentes de alguns partidos políticos, qual meninos de coro, clamando inocência e lançando acusações hipócritas a determinada força politica, como sendo o único promotor do “banho” em São Tomé e Príncipe, tentando convencer a opinião publica de que não rezam pela mesma cartilha, para depois de garantir a vitoria, assumirem num órgão de comunicação social estrangeiro que afinal, o “banho” é um mal necessário e quem não o praticar, quem for ingénuo para lutar contra isso, acabará por ter mais prejuízos do que ganhos. E esta, hein?!

Felizmente, creio que o mito de combater o “banho” com mais “banho”, a desculpa de utilizar as mesmas armas que o adversário para não partir em desvantagem está a desvanecer e a classe política já começa a perceber que o “banho”, principalmente o “banho” de boca de urna, é cada vez mais ineficaz e que em última analise, tem algum efeito no reforço da convicção dos militantes mais ferrenhos e talvez, serve como “o canto da sereia” para alguns eleitores indecisos na hora da verdade, mas, cada vez tem menos impacto na consciência da maioria do eleitorado, que vai para as urnas já com uma opinião formada, com uma decisão tomada, baseada sobretudo nas suas ilusões, desilusões ou expectativas criadas em volta de um partido ou candidato. Por isso, penso que nem vale a pena nos matarmos a matutar soluções milagrosas para resolver o problema do “banho” em São Tomé e Príncipe, já que esse fenómeno acabará fatalmente por desaparecer a medida que os nossos políticos forem se dando conta que cada vez se “investe” maiores quantias de dinheiro e os resultados correspondem cada vez menos às suas expectativas, já que dependem cada vez mais de outros factores que são normalmente negligenciados. Mesmo os que continuarem a persistir nessa pratica, por causa do tal “banho” de jacuzzi, encontrarão resistência nos seus parceiros internacionais, que não estarão dispostos a manter a torneira infinitamente aberta, a troco de coisa nenhuma. Dois grandes partidos sentiram isso na pele nas eleições passadas, veremos até onde vai a temeridade e teimosia dos outros dois. Se por acaso estiver errado nas minhas conclusões e a coisa continuar, cada vez com maior intensidade, que Deus se compadeça então com a alma da nossa pobre democracia e consequentemente, com o destino da nossa nação.

AH, PORQUE SOU JOVEM E TAL...(PARTE II)

Ponto prévio: No texto anterior, falei da necessidade da renovação e rejuvenescimento da nossa classe política ser feita de forma sustentada e equilibrada, respeitando alguns critérios de selecção que nos garantam à partida, algum acréscimo de qualidade e a esperada evolução positiva do nosso cenário político com a introdução de novos (e mais bem preparados) actores políticos que possam fazer a diferença e romper com os maus costumes do passado. No fundo, explanei o meu ponto de vista sobre a forma que achava mais equilibrada e sustentada para que a ascensão da juventude no cenário político fosse mais profícua, quer para a própria juventude, quer para o País. Agora, irei mais fundo na análise dessa questão e, sob outra perspectiva, tentarei dar maior ênfase às dificuldade e aos entraves que muitas vezes alguns jovens, mesmo sendo competentes, qualificados e já com uma folha de serviço apreciável, encontram para singrar na cena política São-tomense, até porque, no primeiro texto, falei no abstracto e no geral, enquadrado num cenário de normalidade, que como sabemos nem sempre é o que se verifica na sociedade São-tomense.

“Nem sempre conseguimos construir o futuro para a nossa juventude, mas podemos construir a juventude para o futuro” – Franklin Roosevelt, ex-presidente dos E.U.A


Desde os primórdios da humanidade que o conflito inter-geracional é parte integrante e acutilante das sociedades humanas, manifestando-se em todos os sectores e actividades possíveis, variando a sua intensidade e visibilidade na proporção directa dos interesses que estejam em jogo. Nesse eterno conflito, normalmente os mais velhos encaram os jovens como uma ameaça aos seus domínios e utilizam todas as artimanhas para tentar impedir ou no mínimo, retardar ao máximo o alcançar das suas pretensões, o que leva a que muitas vezes a transição não seja feita de forma totalmente pacífica.

Em São Tomé e Príncipe, não é preciso fazer-se uma análise muito profunda à nossa sociedade para percebemos que é na política onde esse choque de gerações se manifesta em todo o seu esplendor, e nos dias de hoje, com mais intensidade do que nunca. Num lado, temos os anciões lá da tribo, serena e confortavelmente instalados na cubata do poder e relutantes em “largar o osso” por iniciativa própria e no outro, temos os jovens aspirantes, cada vez mais “olho aberto”, mais inconformados e impacientes, a exigirem por direito próprio, um lugar ao sol. Num lado, temos a experiencia, a maturidade e a casmurrice a dizerem constantemente que ainda têm muito a dar e que o seu prazo de validade ainda não expirou, reivindicando “o direito inviolável” à oportunidades consecutivas para continuar no poleiro, dizendo à juventude para ter calma, para crescer e aparecer, que a sua hora vai chegar (mas não dizem quando), e no outro lado, temos a irreverência, a impetuosidade e o fervor juvenil, que exige a renovação e clama por oportunidades para provar que já está preparada para dar um contributo frutuoso à causa e que pode fazer melhor do que os mais velhos. No meio de tudo isso, temos os outros membros da tribo, a maioria silenciosa, que ao fim de 35 anos de muitos sonhos e anseios adiados, começam também a manifestar sinais claros de alguma preferência por novos rostos, novas mentes e consequentemente, novas formas de se fazer política. Como sair então desse imbróglio?

Tal como acontece na natureza, nos casos daqueles animais que vivem em comunidade, submetidos à uma liderança bem identificada, sempre que um “mancebo” quiser por em causa a liderança do macho Alfa, tem que desafia-lo para um mano-a-mano em que o vencedor assume (ou reassume) automaticamente o lugar de líder até ao próximo duelo. Nesses casos, a iniciativa do duelo nunca parte do líder, e os aspirantes só avançam quando sentem que estão suficientemente preparados enfrentar o “chefe” com algumas hipóteses de sucesso. Era também assim que as coisas se resolviam entre nós, humanos, há alguns milénios atrás, antes de descobrirmos que podíamos usar melhor a “mona” e consequentemente, criar algumas regras para tornar a nossa vida em comunidade mais civilizada.

Trouxe esse exemplo à baila para, fazendo as naturais adaptações para a nossa realidade política, reforçar o meu ponto de vista sobre a necessidade de ser os “mancebos” a terem uma atitude proactiva nesse “combate” e também focar a necessidade de estarem minimamente preparados para enfrentar o poder instituído com algumas hipóteses de sucesso, caso contrário, perecerão no campo de batalha ou, se por um golpe de sorte, forem bem sucedidos, o seu reinado não será sustentado em alicerces profundos, logo, não terá os efeitos esperados e será efémero.

Não foi por acaso que escolhi uma célebre frase do Roosevelt sobre a juventude para iniciar o meu texto, a verdade é que os nossos dirigentes têm se esquecido de preparar a juventude para o futuro, sobretudo em termos de liderança política, talvez por esquecimento, talvez por desleixo ou talvez por conveniência, de modo a mantê-la impreparada, acomodada e eternamente dependente deles, para não ousarem um dia rebelarem-se e fazer-lhes frente. Felizmente para os jovens, as recentes eleições colocaram definitivamente o assunto da renovação na agenda de todos os partidos políticos São-tomenses e de repente, algo que já devia ser debatido há muito tempo, de forma equilibrada e concertada, de modo a se fazer uma transição gradual onde seria de todo interessante mesclar a experiencia dos mais velhos com alguma imaturidade dos mais jovens, ganha contornos de urgência, e o partido que não for suficientemente esperto para apanhar o comboio, mesmo já em andamento, corre o sério risco de ficar para trás, ou de sofrer uma debandada sem precedentes dos seus militantes mais novos. Esperemos pois, as cenas dos próximos capítulos para sabermos quem realmente escutou o sussurro da maioria silenciosa.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

AH, PORQUE SOU JOVEM E TAL...

“ A juventude é inconformada, irreverente e até incómoda, mas é precisamente isso que se espera dela.” - Francisco Sá Carneiro, ex-primeiro-ministro Português.

Nunca em São Tomé e Príncipe as palavras “juventude” e “renovação” estiveram tanto em voga como nos dias de hoje e tudo graças aos resultados surpreendentes das eleições autárquicas e legislativas que, segundo o senso colectivo, consagraram o ADI, sobretudo por causa da tão propalada renovação dos candidatos que apresentou ao eleitorado e penalizaram os outros partidos, sobretudo, afirma também o senso colectivo, por causa dos ditos “dinossauros”, gastos, cansados, ultrapassados e avessos à renovação das suas estruturas de direcção, que, mais uma vez, contrariando até, as expectativas dos seus militantes, decidiram submeter-se ao veredicto popular. No que me diz respeito, até acho que esse aspecto não foi assim tão relevante no desfecho dessas eleições, já que, por exemplo, da parte do ADI, o partido vencedor, a estrutura dirigente que saiu do ultimo congresso é praticamente a mesma dos últimos anos, com a diferença de ter havido alguma injecção de “sangue novo” na comissão politica e agora, com a provável nomeação de um jovem para a vaga do “adiado” Secretário-geral, já que ganharam as eleições e é conveniente assumir claramente a tal aposta na juventude. Como uma renovação pressupõe a saída de alguns, para a entrada de outros, creio que em última análise não podemos aplicar o adjectivo “renovado” ao ADI, que se limitou a contratar (e o termo “contratar” não é aqui utilizado de forma inocente) algumas jovens promessas da sociedade civil e de outros partidos para, estrategicamente se apresentar ao eleitorado de cara lavada chamando a si a personificação legítima da mudança. Não querendo fazer juízos de valor sobre quem quer que seja, sou obrigado a reconhecer que essa táctica até teve algum impacto, sobretudo junto da população urbana. Fora isso, como sempre, as duas campanhas do ADI foram centradas e centralizadas na figura do seu presidente e não me lembro de ver algum jovem a discursar nos comícios ou a fazer companhia ao Patrice Trovoada nos seus cartazes de propaganda política, com duas ou três honrosas excepções que ele fazia questão de mostrar ao povo nas passeatas, nos tempos de antena e nos comícios, qual “contratações galácticas” do ultimo defeso. Duvido pois, que a maioria da população tenha escolhido o ADI apenas por causa da dita renovação do partido, até porque, como é prática comum em São Tomé e Príncipe, a esmagadora maioria dos candidatos às Câmaras distritais e à Assembleia Nacional apenas são conhecidos pelos iluminados que se dão ao trabalho de consultar a lista publicada pelo Supremo Tribunal de Justiça. Quais foram então os verdadeiros motivos da vitoria do ADI? Isso são contas do outro rosário, a que me dedicarei numa dessas tardes de ócio. Retornemos então à questão da “renovação” e “juventude”.

Em condições normais, há três vias de um jovem atingir uma posição de destaque dentro de uma instituição, grupo ou mesmo estrutura familiar: Em primeiro lugar, pela conquista própria, em resultado da demonstração de competências e qualidades que marcam a diferença e o levam a uma promoção natural, inquestionável e sustentada dentro do grupo ou instituição; Em segundo lugar, através do beneplácito ou anuência do poder instituído, ou seja, com a devida “autorização” ou sugestão dos mais velhos, em resultado de uma necessidade momentânea, por questões de conveniência/interesse ou até pela imposição de preenchimento de cotas obrigatórias; Por ultimo, através da selecção natural, que “obriga” a substituição dos membros mais antigos por questões de envelhecimento avançado ou falecimento. Posso também considerar uma quarta via, em que os três factores acima elencados são combinados em doses variadas.

Naturalmente que na pratica as coisas não são assim tão lineares e as vezes há pormenores imprevistos e imprevisíveis que fazem alterar a ordem dos factores com influencia no resultado da equação e claro, as tais excepções que confirmam a regra. De qualquer forma, sou daqueles que defendem que apenas pela primeira via se tem alguma garantia de sucesso e afirmação sustentável dos jovens, e consequentemente da instituição que servem, já que, com raríssimas excepções, apenas pela primeira via se consegue dar o verdadeiro valor ao mérito e premiar a competência. No caso especifico do panorama político São-tomense, em que a promoção dos jovens no seio dos partidos políticos pode ter reflexos na governação do País, é pois, recomendável alguma prudência e responsabilidade na concretização do pressuposto da renovação. Porque se podemos nos dar ao luxo de arriscar irresponsavelmente na escolha e promoção de jovens quadros nas nossas empresas ou instituições privadas, com a desculpa do empreendorismo, revitalização ou seja lá o que for, assumindo os riscos inerentes a essa escolha e acatando as consequências negativas, caso as haja, o mesmo não devemos fazer, quando estão em causa os interesses públicos e os destinos de uma nação.

Posto isto, tenho que concordar com o autor da frase de abertura desse texto e dizer que a juventude tem que ser sim, inconformada, irreverente e até incómoda, se necessário, mas também tem que ser responsável, ponderada, convicta e paciente, acrescento eu. Principalmente aquela juventude com queda para a politica, a quem brevemente será entregue (ou conquistarão) as rédeas do destino de São Tomé e Príncipe. Inconformada na busca incessante de oportunidades para provar o seu valor e dar mostras de competências para assumir determinadas responsabilidades, mas responsável, para ter a noção das suas limitações e saber dizer “ainda não” sempre que a missão, apesar de aliciante, se manifestar demasiadamente complexa; Irreverente na forma de produzir novas ideias e novos conceitos, ou mesmo na procura de novas formas de abordar os conceitos e as ideias antigas, mas ponderada, para não cair na tentação de radicalizar as suas acções e excluir á pressa, a experiencia dos mais velhos, onde apesar de tudo, ainda se pode ir beber algumas coisas úteis; Incómoda na forma de se fazer ouvir e de exigir algum espaço para crescer e dar também a sua contribuição à causa, mas paciente, para não queimar as etapas necessárias para uma afirmação plena e sustentada no cenário político; Por ultimo, mas não menos importante, a juventude tem que ser convicta na defesa dos seus ideais, na procura de uma nova forma de pensar a politica e o País e não deixar-se enganar por truta e meia e contribuir assim, para a degradação de valores que hoje se verifica na nossa sociedade, em geral, e na politica, em particular, de forma a podermos todos esperar coisas bonitas e positivas daqueles que um dia já foram apelidados de “homens do amanha”.

Infelizmente, no estado actual das coisas, atendendo a ausência de convicções fortes e de objectivos comuns, e sobretudo, aos ziguezagues e reviravoltas inimagináveis na forma de pensar e de agir de grande parte dos aprendizes de políticos da nossa geração, acredito cada vez menos na possibilidade de sermos nós a mudar o rumo das coisas. Não creio pois, que se possa esperar coisas positivas de jovens que são colocados em lugares de destaque dos partidos, atendendo apenas à sua data de nascimento como critério de selecção, em resposta demagógica a um pedido de renovação vindo do eleitorado. Não creio também que se possa esperar coisas positivas de jovens que, sob o signo de uma ambição desmedida e sede pelo poder, forcem a sua escalada nas estruturas internas dos partidos políticos apenas porque são jovens e formados, negligenciando outros factores importantes, como a inexperiência, a imaturidade política e as vezes, uma incompetência preocupante que se nota à vista desarmada. E por último, não creio naturalmente que também se possa esperar coisas positivas de partidos políticos que se negam a renovar-se e a rejuvenescer-se de forma sustentada e equilibrada, e que apenas escancaram as janelas de oportunidades aos jovens, em caso de necessidade estratégica ou por desaparecimento físico de um dos membros com lugar cativo. Pelo bem de São Tomé e Príncipe, espero que o tempo, quiçá os contratempos, me mostrem que afinal estou errado e que ando aqui a debitar reflexões estúpidas, sem fundamentos nenhuns. Era bonito, não era?!